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terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

A luta de classes não pode ser ocultada. Ela é, e continuará a ser, o “motor” do desenvolvimento social.

Giorgos Marinos*

22/01/2022

 

Giorgos Marinos

As grandes greves e as massivas manifestações operárias e populares que sacudiram o Cazaquistão no início do ano mostraram que, inclusive em condições de contrarrevolução, duras perseguições, legislação política e sindical draconiana, proibição de 600 sindicatos, de partidos e organizações comunistas, as contradições sociais transcendem os acontecimentos e podem explodir quando se formam as condições necessárias, podem intensificar-se e transformar-se em conflito social entre a classe trabalhadora e a burguesia, confirmando que "o que não acontece em um ano acontece em pouco tempo". A luta de classes, como motor do desenvolvimento social, tem uma base objetiva e expressa o conflito intratável entre exploradores e explorados. Isso foi vivenciado no Cazaquistão, localizado em uma área de grande importância estratégica, confirmando que “o que não acontece em um ano, pode acontecer em uma hora”. A luta de clases, como motor do desenvolvimento social tem base objetiva e expressa o conflito inconciliável entre os exploradores e os explorados. Isto foi experimentado no Cazaquistão, situado em uma zona de grande importância estratégica, com papel importante na economia global, acesso ao mar Cáspio, dotado de enormes reservas de hidrocarbonetos, produtor de 70% do PIB dos Estados da Ásia Central, possuidor de fontes de riqueza importantes, como gás natural, petróleo, urânio, ouro e outros minerais.

Os monopólios do Cazaquistão exploram a classe trabalhadora junto com os monopólios estadunidenses da "Chevron" e "ExxonMobil", os europeus da "Eni", "Shell", "Total", a China National Oil Company (CNPC) e outras grandes empresas chinesas, russas, holandesas, belgas, francesas que investiram bilhões de dólares no país.

A burguesia do Cazaquistão segue a chamada "política multidimensional". Dá prioridade às relações com a Rússia e mantém relações fortes com a China, EUA e outros países capitalistas fortes, para garantir da forma mais eficaz seus próprios interesses e fortalecer sua posição na região. Participa da Organização de Cooperação de Xangai, na Organização do Tratado de Segurança Coletiva e faz parte da “Nova Rota da Seda” promovida pela China. Ao mesmo tempo, participa da chamada "Cooperativa para a Paz" da OTAN, em exercícios da OTAN, tem reforçado a colaboração e a relação com os Estados Unidos, que, além disso, mantém na região laboratórios de guerra biológica , assim como com a UE, para a qual exporta a maior parte de sua riqueza energética, faz parte da "Organização dos Estados Turcos", promovida pela Turquia que, por sua vez, integra a OTAN.

Os interesses dos EUA, Rússia, China, União Europeia e da Turquia são intensos, os antagonismos inter-imperialistas e as contradições inter-burguesas estão colocadas, porém isso não oculta o peso das mobilizações populares, da luta de classes, não se pode subestimar sua importância. Ao contrário, esse fato destaca ainda mais a importância das lutas desenvolvidas sob estas duras condições.

As mobilizações populares se desenvolveram em um determinado terreno

No Cazaquistão, assim como em todos os estados da antiga União Soviética, as marcas da derrubada do socialismo e da restauração do capitalismo são indeléveis, com duras consequências contra a classe trabalhadora e as camadas populares. O poder do capital e a propriedade capitalista nos meios de produção, o desenvolvimento apenas com critérios de lucro e a política antipopular implementada pelos governos de Nazarbayev, após a contrarrevolução, pioraram o padrão de vida ano após ano. Grandes massas populares se viram em condições de pobreza e desemprego, os serviços sociais foram degradados, o grau de exploração atingiu níveis elevados, os capitalistas locais e estrangeiros que entraram dinamicamente em ramos de importância estratégica aumentaram sua riqueza.

A classe trabalhadora reagiu e, em 2011, no oeste do Cazaquistão, na cidade de Zanaozen, foram organizadas greves na indústria de mineração que duraram meses inteiros, enfrentaram uma repressão brutal, tiveram mortos, feridos e um grande número de presos. O Estado burguês baniu o Partido Comunista e centenas de sindicatos.

Essa luta foi um legado para a classe trabalhadora e impactou o período seguinte. Com a entrega do controle por Nazarbayev a seu sucessor na presidência Tokaev e a mudança no governo burguês em 2019, a política antipopular continuou, a polarização entre riqueza e pobreza se multiplicou, a contradição entre capital e trabalho tornou-se ainda mais aguda.

Nos dois anos anteriores aconteceram novas greves promovidas por sindicatos ou comitês de greve não reconhecidos oficialmente pelas autoridades, enquanto o aumento do preço do gás natural, anunciado no início o ano, que objetivamente levaria a uma carestia geral de alimentos e bens amplamente consumidos, foi a faísca que acendeu o fogo das grandes lutas operárias-populares, da insurreição que ocorreu no começo de janeiro.

As manifestações começaram no oeste do Cazaquistão, na região de Magistau, em Aktau e Zanaozen por iniciativa dos trabalhadores da indústria do petróleo que protagonizaram a luta. Surgiram formas de auto-organização, formaram-se conselhos de trabalhadores. Esse exemplo dirigiu e deu início à generalização das mobilizações que se expandiram para regiões críticas e atravessaram o país.

Essas lutas têm traços qualitativos importantes

O proletariado industrial teve o papel principal, paralisou a indústria mineira, a metalurgica, grande parte das minas de carvão, o coração da economia. Os trabalhadores da indústria petrolífera da empresa "Tengiz chevr oil" no Mar Cáspio, controlada pelo capital estadunidense, entraram na luta. Se mobilizaram desempregados, camadas populares muito pobres que entraram em confronto com a polícia. Protestos em massa foram organizados nas grandes cidades, nos centros periféricos do norte e no leste do Cazaquistão, houve ocupações de prédios.

A tática do regime burguês

Os apelos à "paz social" foram inicialmente combinados com uma tentativa de aliviar a situação, com promessas de redução do preço do gás natural. O presidente Tokayev demitiu o primeiro-ministro e o governo, tirou Nazarbayev do cargo de presidente do Conselho de Segurança, mas os trabalhadores rebeldes insistiram, continuaram as mobilizações com maior intensidade, tendo a greve como arma básica. A tentativa de incriminar as formas de luta não teve êxito. A classe trabalhadora não vai se ajoelhar diante da legalidade burguesa; ela está seguindo a forma que faz a luta mais eficaz.

Este fato tem grande importância porque, apesar das dificuldades no desenvolvimento da luta operário-popular, os trabalhadores tiveram os reflexos para defender a independência da luta, rechaçaram o envolvimento nas contradições interburguesas, entre a camarilha presidencial atual e a anterior, que se intensificaram no processo. As mobilizações muito menos foram atreladas aos objetivos do banqueiro Ablyazov, que tramava intervenções do exterior, como representante de setores da burguesia ligados aos EUA.

O Estado burguês se viu numa uma situação bastante difícil, declarou o país em estado de emergência, usou uma repressão feroz, cometeu dezenas de assassinatos e, inclusive usou grupos de provocadores em seus planos. Sob o pretexto de um ataque de “terroristas”, convocou a Organização do Tratado de Segurança Coletiva (CSTO), liderada pela Rússia, para enviar unidades militares especiais para o lado do governo burguês que estava matando a classe trabalhadora, o povo em luta.

Uma vez mais, ficou demonstrado que as burguesias em coalizão e as alianças imperialistas formadas pelos Estados capitalistas não hesitam em ajudar a salvaguardar o poder burguês e consolidar sua posição contra seus concorrentes.

Esses fatos são conclusivos e expõem todos aqueles que, com sua posição, inclusive alguns partidos comunistas, que se dirigiram contra a luta popular, a incriminaram, aceitaram as alegações do governo burguês e apoiaram a intervenção imperialista da Rússia, deram pretextos para intervenções Euro-Atlânticas a serviço das burguesias.

Existe a experiência das chamadas "revoluções coloridas", com a intervenção dos EUA e da UE, como no caso da Ucrânia, com a participação de grupos provocadores, que intervêm ativamente nesses casos, mas esses fatos não implicam a condenação das lutas populares, pelo contrário, tornam necessário o seu apoio, como expressão mais decisiva da solidariedade internacionalista.

A luta de classes não se leva a cabo de uma forma "clara", ela está envolvida na complexa teia de contradições interburguesas e antagonismos imperialistas. Os comunistas devem distinguir os novos elementos que existem em cada momento e se posicionar com critérios de classe; manifestar seu apoio à luta operária-popular; estudar a orientação desta luta; rejeitar posições que levem ao aprisionamento ao lado de um ou outro setor da burguesia, de um ou outro centro imperialista. Isso é de particular importância no caso dos eventos no Cazaquistão.

Os membros, as forças que estão agrupadas no Movimento Socialista do Cazaquistão, em condições de clandestinidade, em um ambiente de correlação de forças muito negativa, se envolveram na luta, tentaram intervir nos acontecimentos, mais especialmente na região de Zhanaozen. A indignação e a raiva se converteram em ação organizada. As demandas pelo aumento de salários e pensões, a contenção de preços, a oposição ao aumento da idade de aposentadoria e às privatizações, a demanda pela demissão do governo, a reivindicação por direitos e liberdades políticas, entre outros, jogaram um papel decisivo no agrupamento e mobilização dos trabalhadores.

Eventos no Cazaquistão levantam questões muito importantes

O apelo do regime burguês ao seu aliado, a Rússia capitalista, por apoio militar, centrou-se na ação do "inimigo interno", o povo combatente, e expressou o medo diante da escalada da luta de classes e da formação das condições de situação revolucionária. A burguesia defendeu sua dominação e tomou suas medidas para manter o controle, para evitar a "formação de brechas, nas quais o descontentamento e a perturbação das classes oprimidas pudessem infiltrar".

Os problemas destacados, como em outros casos nos últimos anos, quando forças populares apareceram em primeiro plano de forma massiva, são: o nível do fator subjetivo, a situação do movimento revolucionário, do movimento operário, já que não tinham força e a orientação de adequar os objetivos da luta e a escalada da luta, para orientá-la na direção da ruptura total com o poder burguês.

Consequentemente, a conclusão chave tem a ver com a necessidade da existência de um Partido Comunista potente, com uma estratégia revolucionária e fortes laços com a classe trabalhadora para intervir no confronto de classes; formar e usar a posição militante contra o poder burguês; utilizar as brechas criadas pelas contradições interburguesas; proteger a luta da intervenção das forças burguesas e reformistas, dos mecanismos de provocação locais ou estrangeiros; preparar diariamente a classe operária para a derrubada do sistema de exploração, em condições de situação revolucionária. Este é o tormento dos capitalistas e seus representantes políticos.

Os recentes acontecimentos no Cazaquistão são uma fonte para retirar experiência e ensinamentos, aportam novos elementos na luta de classes, no conflito da classe trabalhadora contra a burguesia, assim como na confrontação que se desenvolve no movimento comunista. Surgiu a necessidade do reagrupamento revolucionário do movimento comunista. O KKE continuará a contribuir com todas as suas forças neste intento.

*Giorgos Marinos, membro do Birô Político do CC do KKE (Partido Comunista da Grécia).

Edição: Página 1917 ( https://pagina1917.blogspot.com/ )

Fonte: https://inter.kke.gr/es/firstpage/

Publicado na revista Rizospastis em 22/01/2022.

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