Nota política conjunta do Cem Flores e do Bandeira Vermelha
18.02.2022
Trata-se de uma necessidade objetiva desse modo de produção, em todos os aspectos antagônico às reais necessidades das massas exploradas – em plena pandemia, os senhores do dinheiro investem como nunca em armas e planejam ainda mais mortes!
Desde o colapso do bloco do leste europeu, na virada das décadas de 1980 e 1990, a Ucrânia se tornou o principal palco da disputa entre União Europeia (UE), EUA e Rússia na disputa por ampliação (EUA e UE) ou manutenção (Rússia) de zonas de influência para seus interesses imperialistas. Desfeita a antiga ordem mundial saída da 2ª guerra mundial – que dividiu o mundo em esferas de influências dos EUA e URSS, na qual cada um dos lados se abstinha de intervir no sentido de subverter o domínio da potência adversária – ficou à mercê dos imperialismos europeu e norte-americano um conjunto vasto de países até aí não completamente integrados aos circuitos de produção, comércio e financeiro e das suas relações capitalistas “normais”.
Guerra e barbárie são os frutos do capitalismo na fase imperialista. |
Esse longo processo passou pelo desmembramento da Checoslováquia e da Iugoslávia, pela multiplicação das “revoluções” de veludo, laranja etc., pelo cerco à Rússia pela OTAN através da instalação e concentração crescente de tropas e bases militares, sistemas de mísseis e meios de guerra aéreos e navais na Polônia, nos países bálticos, na Romênia, na República Tcheca e, em 2014, pelo levantamento da praça Maidan que derrubou o governo ucraniano equidistante da Rússia e da UE (no qual a Alemanha teve papel determinante) e ao início da guerra civil na região leste da Ucrânia, que a partir daí se tornou um dos principais palcos de disputa interimperialista.
A atual escalada militar na Ucrânia é mais um episódio do confronto interimperialista em curso, dois meses depois da tensão em volta da Polônia. Que agora a disputa tenha subido de intensidade e a guerra tenha ficado muito mais próxima do que em relação à Polônia e, ainda mais, em relação à Bielorússia, só demostra o agravamento das contradições em função da persistente e crescente crise do capitalismo a nível mundial, o que torna cada vez mais urgente a procura de novos espaços onde as economias imperialistas em crise se possam expandir e tentar ultrapassar a crise iniciada em 2007/08 com a conquista de novos mercados e novas fontes de energia. O que também implica o estabelecimento de novas alianças políticas, econômicas e militares.
É este o quadro que permite compreender porque razão após inúmeras tentativas de acordos e de cessar o avanço armamentista na região, uma crescente escalada militar na fronteira da Ucrânia com a Rússia avança desde o ano passado. De um lado, as tropas imperialistas russas, ao lado das bielorrussas, com o apoio cada vez mais explícito do imperialismo chinês. De outro, tropas ucranianas (que incorporaram inclusive milícias neonazistas) com apoio da aliança imperialista chefiada pelos EUA, a OTAN, ensaiam exercícios militares cada vez maiores, enquanto as lideranças sobem o tom em suas declarações públicas. O aumento da tensão impacta os mercados financeiros globais e os de commodities, e o risco de uma guerra envolvendo grandes potências militares se instala no ar.
Mais uma vez, as palavras de Lênin permanecem verdadeiras: o imperialismo, a fase monopolista do capitalismo, tem como tendências irrefreáveis a violência e a guerra. A violenta concorrência entre os capitais, acirrada na fase monopolista, tem como um de seus desdobramentos necessários a disputa entre estados capitalistas, entre as potências imperialistas e seu poderio bélico cada vez maior, por suas zonas de influência ao redor do mundo.
A base da atual corrida armamentista que ocorre no mundo, cujo caso ucraniano é um exemplo fundamental, é a disputa entre os monopólios de diferentes potências imperialistas, na luta brutal em defesa de seus capitais, pelo controle econômico, comercial e geopolítico e pela elevação de suas taxas de lucro – ao mesmo tempo, luta contra os monopólios rivais e seus estados.
Essa luta interimperialista se acirra diante do contexto de sucessivas crises globais do capital e estagnação econômica, no qual cada potência imperialista busca superar os impactos da crise mantendo ou ampliando sua zona de influência, conquistando novos mercados, fontes de energia, rotas comerciais, seja com alianças estratégicas ou com conflitos mais ou menos abertos, de forma direta ou indireta. Trata-se de uma necessidade objetiva desse modo de produção, em todos os aspectos antagônico às reais necessidades das massas exploradas – em plena pandemia, os senhores do dinheiro investem como nunca em armas e planejam ainda mais mortes!
No caso concreto da Ucrânia, é possível apresentar sucintamente os interesses imperialistas em jogo. Os EUA, com a OTAN como instrumento, avançaram militarmente na região incorporando vários países à sua zona de influência política, ideológica, militar e econômica. Hoje, a OTAN possui bases na maioria dos países do leste europeu, em um verdadeiro cerco militar à Rússia, potência remanescente da antiga URSS, como mostra a ilustração abaixo.
A União Europeia, principalmente com os interesses da Alemanha à frente, aproveitou economicamente a debacle de vários países do leste europeu, estimulou guerras civis e a destruição de países e os incorporou à sua zona de expansão e domínio econômico e financeiro.
A Rússia tem conseguido usar essas diferenças entre os interesses dos blocos americano e europeu e garantido, nos últimos anos, principalmente com a pressão de suas armas e do fornecimento de gás à Europa, frear a expansão da UE e norte-americana na região, mantendo em algum nível suas fronteiras protegidas e garantindo importantes rotas a seus produtos comerciais.
Presa nesta teia de interesses, a burguesia ucraniana parece oscilar entre aliança com a OTAN, para diminuir o peso da Rússia, e a não detonação de uma guerra aberta. Os conflitos políticos e culturais internos na Ucrânia são instrumentalizados para servirem aos interesses das potências imperialistas em disputa naquela área.
A guerra civil na Ucrânia em 2014 foi mais um lance dessa disputa. Ela ocorreu em contexto de maior unidade política interna na Rússia, cujo poder militar novamente se apresenta como um dos mais importantes do mundo, capaz de barrar inclusive ações estratégicas norte-americanas, como no caso da Síria, e, na Ucrânia, com a tomada da Criméia e o apoio militar à instalação de repúblicas separatistas no leste ucraniano.
Se o interesse norte-americano, dominante na OTAN e hoje sob a liderança “democrática” (sic!) de Biden, tem se mostrado de forma clara a favor da intensificação do conflito armado na região, sobretudo para atingir frontalmente a Rússia – em sua estratégia de contenção da Rússia (e da China) – e ampliar seu controle militar e comercial na região, o mesmo não se pode dizer dos principais estados do bloco europeu, Alemanha e França à frente. Isso porque seus capitais tendem a perder com um conflito armado de maior intensidade em sua região, além de ter forte dependência do gás russo, que pode ampliar-se com a colocação em funcionamento do Nord Stream 2, gasoduto sob o Mar Báltico que liga a Rússia diretamente à Alemanha, evitando passar pelos países do leste europeu.
Por outro lado, uma guerra entre a Rússia e a UE (os EUA já deixaram claro que não enviariam tropas para combater os russos) poderia ser catastrófica para os dois blocos, levando aos seus aniquilamentos enquanto potências imperiais. O que seria excelente para os EUA, que não só veriam desaparecer dois poderosos concorrentes, deixando-o sozinho frente à China, como veria exponencialmente aumentado o grau de dependência dos países europeus face ao imperialismo norte-americano.
A ameaça de guerra na Ucrânia, de forma indireta, também põe em cena o conflito crescente entre as duas principais potências imperialistas de hoje: os EUA e a China. Esta última tem dado sinais mais fortes de apoio à Rússia, em clara mensagem aos EUA. Recentemente, até agiram de forma conjunta para reprimirem os levantes no Cazaquistão. Os EUA têm reforçado suas alianças que buscam frear a expansão chinesa, ao mesmo tempo que impulsionam a escalada de uma guerra no leste europeu.
Quando dois imperialismos se confrontam e contam espingardas em preparação de uma guerra com grande potencial destrutivo, isso afeta o proletariado, as massas dominadas e todos os povos. A permanência da crise imperialista, crise do capital, tem levado o mundo a uma crescente onda de violência e conflitos militares, onde o sangue proletário é derramado em disputas burguesas e os refugiados se multiplicam aos milhões. Era preciso estar já na rua por todo o mundo uma forte condenação dos preparativos militares de ambos os lados para não sermos envolvidos numa voragem calamitosa. De nada vale ignorar, antes pelo contrário.
Por que razão não estamos na rua protestando e lançando as palavras de ordem de “Guerra à guerra”, “Guerra popular contra a guerra imperialista”, como fizeram os comunistas às vésperas da primeira guerra mundial, contra as guerras da Coreia e do Vietnam, contra o cerco à Cuba e a invasão do Iraque? Não estamos na rua porque o campo comunista e anti-imperialista está muito enfraquecido e desorientado, não tem um núcleo coerente e firme e está eivado de todo o tipo de posições reformistas, conciliatórias e interclassistas que o paralisam quase que por completo. Contra este desastroso estado de coisas, tornam-se cada vez mais urgentes as tarefas de reconstruir partidos comunistas em todos os países e reerguer uma nova corrente internacional que deite fora todo esse lixo centrista e avance na posição revolucionária, a partir de sólidas ligações com as massas proletárias e trabalhadoras e suas vidas e lutas.
A posição comunista deve levantar bem alto sua bandeira contra as guerras imperialistas, levantar a bandeira pela destruição desse sistema que nos leva novamente à sombra de uma guerra mundial. Nem um dos lados nessa contenda expressa a posição proletária e nem o interesse de seus povos. São representantes de seus monopólios, de seus capitais e nos querem como bucha de canhão para seus interesses. As balas devem sim se voltar para os generais, para os senhores da guerra e seus mandantes, os capitalistas.
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