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domingo, 31 de maio de 2020

Origem e Declínio do Capitalismo*

Jorge Beinstein**
Maio de 2013

Retorno à origem

   Em certos rituais funerários de tempos remotos os mortos eram colocados em posição fetal. Encontraram-se por exemplo restos de homens do neandertal sepultados dessa maneira com a cabeça a apontar para o Oeste e os pés para o Leste. Algumas hipóteses antropológicas sustentam que essa disposição do cadáver se relacionava com a crença no renascimento do morto. A civilização burguesa à medida que avança a sua senilidade parece reiterar esses ritos. Preparando-se para o desenlace final aponta a cabeça para a sua origem ocidental e vai acomodando o corpo degradado procurando recuperar as formas pré-natais, tentando talvez assim conseguir uma vitalidade irremediavelmente perdida.
   
   O fim e a origem aparentam convergir, mas o ancião não consegue voltar ao passado e sim, antes, reproduzi-lo de maneira grotesca e decadente. Rumo ao final do seu percurso histórico o capitalismo volta-se prioritariamente para as finanças, o comércio e o militarismo no seu nível mais aventureiro "copiando" seu início quando o Ocidente conseguiu saquear recursos naturais,sobre-explorar populações e realizar genocídios acumulando desse modo riquezas desmesuradas em relação ao seu tamanho. Isso lhe permitiu expandir seus mercados internos, investir em novas formas produtivas, desenvolver instituições, capacidade científica e técnica. Em suma, construir a "civilização" que levou Voltaire a dizer:   "a civilização não suprime a barbárie, aperfeiçoa-a".

   A decadência do mundo burguês de certo modo imita a sua origem, mas não o faz a partir de um protagonista jovem e sim decrépito e num contexto completamente diferente:   o da gestação era um planeta rico em recursos humanos e naturais disponíveis, virgem do ponto de vista dos apetites capitalistas. O atual é um contexto saturado de capitalismo, com fortes espaços resistentes ou pouco manejáveis na periferia, com numerosos recursos naturais decisivos em rápido esgotamento e um meio ambiente global desarranjado.

Fim de ciclo e  Decadência: do capitalismo industrial ao parasitismo.

   Toda a história do capitalismo é atravessada por numerosas crises de curta, média e longa duração, de gestação, de nascimento, de crescimento, de maturidade, de decadência, sectorial, pluri-sectorial, geral, etc. A atual conjuntura global costuma ser descrita empregando o termo crise (do neoliberalismo, financeira, sistêmica, do capitalismo, de civilização...). Trata-se realmente de uma crise ou de algo mais? Encontramo-nos perante uma turbulência devastadora ou não tão truculenta mas anunciadora de uma nova ordem mundial capitalista, ou seja, de uma regeneração sistêmica ou antes do canto do cisne de uma civilização caduca? No primeiro caso cabia falar de crise de reconversão, de destruição criadora no sentido shumpeteriano, no segundo poderia em princípio ser definida com uma só palavra:   decadência.

   Os conceitos de crise e decadência são ambíguos, o seu uso não resolve completamente as interrogações que coloca a descrição da realidade atual. Em geral falamos de crise quando enfrentamos uma turbulência ou perturbação importante do sistema social. O conceito de decadência costuma ser associado à ideia de irreversibilidade, de trajetória iniludível, de caminho mais ou menos lento, acidentado ou calmo, rumo à extinção, rumo ao final. Contudo, a história mostra tanto longos processos de declínio que culminam com o fim de uma sociedade ou civilização como fenômenos vistos como decadências mas que em algum momento se convertem em renascimento, no início de uma segunda juventude. Sobretudo durante certos períodos de transição cultural onde se combina o velho dominante mas ainda hegemônico com o novo ascendente ainda que suportando derrotas, fracassos próprios das experiências demasiado jovens, demasiado dependentes do "senso comum" estabelecido pelas antigas verdades capazes de sobreviver durante muito tempo ao seu crescente divórcio com a realidade.

quinta-feira, 28 de maio de 2020

Entrevista com Ivan Pinheiro, parte III.

A Guerra Continua*

LUIZ RENATO MARTINS**

                                                                                                     À memória de Chico de Oliveira

Brasil 2013: a floresta seca começa a arder
  
As grandes e surpreendentes manifestações de junho de 2013,[i] em 22 capitais de estados e 400 cidades do Brasil, com três milhões de trabalhadores envolvidos em greves, foram as maiores no Brasil desde o movimento das Diretas Já (1984), este último abortado em rito sumário pelo MDB que o trocou pela falsa “Transição” via Colégio Eleitoral.

Os protestos de 2013 mudaram decisivamente o panorama político interno, assim como a imagem global do Brasil. Até então, o Brasil era tido internacionalmente como exemplo de democracia consolidada e estável, e além disso, sua economia, como fundamentalmente próspera. Duas capas de The Economist exemplificam tal mudança da imagem do Brasil no exterior, observada a partir de junho de 2013. Assim, em novembro de 2009, a revista publicou em sua capa a seguinte chamada: “O Brasil decola (Brazil takes off)”. Pelo contrário, na capa de setembro de 2013 depois dos protestos massivos, estala uma dúvida: “O Brasil gorou? (Has Brazil blown it?)”.

Porém, bem antes de tais comentários (no fim das contas em sintonia com a busca de oportunidades de investimento rentáveis) formulou-se um alerta veemente, associado a uma crítica fulminante, por parte do sociólogo e fundador do PT Francisco de Oliveira, ex-membro das equipes que haviam preparado os planos de governo do PT nas campanhas dos anos 1980 e 1990. Assim, em ensaio publicado em junho de 2003,[ii] apenas seis meses após a posse de Lula na presidência, o autor diagnosticou o desenvolvimento no Brasil de um novo padrão de acumulação de capital, baseado na apropriação de fundos públicos, transferências patrimoniais, privatizações e outras formas de “acumulação truncada”. Para concluir, assinalou que um tal processo era conduzido por uma “nova classe”: sindicalistas atuando concertadamente com especialistas em finanças e conselheiros dos fundos de pensões.

Deste modo, o que Francisco de Oliveira observou, já em marcha na primeira administração de Lula, não foi outra coisa senão a articulação de dirigentes do PT, e lideranças sindicais associadas, com o capital monopolista, para a gestão compartilhada dos fundos de pensão, nos quais o governo como grande empregador exercia papel decisivo. Tais fundos, muitos dos quais formados por poupanças dos empregados de grandes empresas estatais, movimentavam somas gigantescas, equivalentes às dos maiores players do mercado financeiro de São Paulo.

O sentido da advertência de Oliveira demorou dez anos para chegar às ruas, mas quando se tornou tangível e evidente, a multidão se apoderou das ruas tempestuosamente. O que pretendiam os heterogêneos manifestantes de 2013, em meio a queixas diversas e expressões de descontentamento generalizado?

A Guerra Civil Declarada*

Luiz Renato Martins**


                                                                                        À memória de Chico de Oliveira

Crítica histórica radical

Para o bloco político derrotado em outubro de 2018 no Brasil (a classe trabalhadora e seus aliados), a ascensão eleitoral de um bloco político de ultradireita sublinha a necessidade urgente de medidas de autodefesa, frente a uma guerra civil de classe abertamente declarada. Também convoca a uma crítica histórica radical e de largo alcance, não menos vital para a sobrevivência política dos trabalhadores.
O golpe de 1964, os tanques nas ruas.

O regresso – numa nova chave – dos militares ao controle direto do Estado marca um câmbio no regime e nas relações de classe. Não obstante, o ciclo aberto agora apresenta alguns elementos similares aos do regime civil-militar que tomou o poder manu militari em abril de 1964, em nome do consórcio entre o capital monopolista e as Forças Armadas Brasileiras-FFAA. [i]

Do outro lado do espelho, o passado não passou

Mas como sustentar uma crítica histórica radical a fim de distinguir as classes sociais e suas frações, assim como o jogo próprio dos atores políticos? Neste caso, esta deve se fundar na crítica concreta de dois mitos ou falácias da chamada “Nova República” (1985-2018), ora finda. Crítica, pois, de mitos que se traduziram em ilusões de superação do ciclo totalitário, a saber, resumidamente, do putsch civil-militar de abril de 1964, do AI-5 (Ato Institucional 5, 13.12.1968) e dos ‘anos de chumbo’ dos governos Médici (1969-74) e Geisel (1974-79).

Vistos como opostos, os mitos falaciosos da “Nova República” alimentaram uma disputa fictícia durante mais de trinta anos. Sob tal disputa, um fundo comum foi eclipsado – o verdadeiro eixo de poder no Brasil – que agora abertamente retoma o controle direto do Estado, para surpresa dos incautos (que são muitos) e alívio do “consórcio” há muito no comando.

Efeitos paralisantes

Dois mitos em um, portanto, ou uma falácia desdobrada em duas: 1. a da celebrada “Transição” (1984-5), a “cena originária” da “Nova República”; 2. a do êxito da “política social” da “Nova República” durante os governos Lula I e II, traduzido na fórmula “lulista” de distribuição, que em seu auge (2010) obteve uma taxa de aprovação de 80%, como  bom ou ótimo governo.[ii]

O totem                                                                              

Sob as duas caras do Janus da “Nova República” há um totem: o do consórcio civil-militar que interdita a frente política entre trabalhadores e setores pequeno-burgueses. De tal frente derivaram as lutas pelas “reformas de base” e outras, antes do golpe de abril de 1964.[iii] Sob tal totem, interditou-se toda referência à autonomia política dos trabalhadores e à luta de classes. Ao peso do interdito se acrescentou outra falácia: a da modernização e desenvolvimento social através do capitalismo.

quarta-feira, 27 de maio de 2020

Pandemia e Fracasso Burguês

Ney Nunes 

27/05/2020 

Em plena ascensão da pandemia, os governantes começaram a "flexibilizar" as restrições parciais de funcionamento das atividades. Fazem isso, mesmo com milhares de pessoas morrendo sem ao menos conseguirem tratamento, por falta de leitos, de equipamentos, de remédios e de pessoal qualificado.     


Unidades de saúde em colapso.

A subnotificação e a fraude quanto ao número de mortos por covid-19 vêm aumentando, a exemplo do ocorrido no Rio de Janeiro, onde o prefeito Crivella, alinhado com Bolsonaro, resolveu apagar 1.177 óbitos da planilha divulgada pela Prefeitura.

Multiplicam-se casos de corrupção vinculados à pandemia, com superfaturamento nas compras de equipamentos e na construção de hospitais de campanha. A gestão terceirizada da saúde pública, além de custar um absurdo, mostra toda a sua ineficiência no atendimento aos doentes. Temos hospitais e UPA's com número insuficiente de profissionais, que são, inúmeras vezes, obrigados a trabalhar sem os equipamentos de proteção individual necessários.

As medidas paliativas e desencontradas de prefeitos, governadores e, o mais grave, a campanha genocida do presidente da república pela abertura de todas as atividades, atendendo interesses do empresariado, indicam a total incapacidade dos governos burgueses em proteger a vida da nossa população na pandemia.

Infelizmente, confirmam-se os piores prognósticos.

domingo, 24 de maio de 2020

Debate sobre a Restauração Capitalista na China*

70 Anos da Revolução Comunista na China e 41 Anos do Início da Restauração Capitalista
 * Fonte: Cem Flores, publicado em 11/10/2019.
Capa da TIME de 1983: Abolindo o Fantasma de Mao
No último dia 5 de outubro publicamos o artigo A Restauração Capitalista na China: textos de Francisco Martins Rodrigues. Naquele artigo, apresentamos três textos do dirigente comunista sobre as “reformas econômicas” chinesas e seu caminho rumo à restauração capitalista, escritos nos anos 2000. Também fizemos uma apresentação aos textos de FMR com as teses que estamos estudando, debatendo e desenvolvendo em nosso coletivo comunista que nos permitem concluir, em termos marxistas-leninistas, que a China hoje é um país capitalista, país que ocupa um lugar dominante no sistema capitalista mundial, o sistema imperialista. Ou seja, isso significa que a China hoje também é um país imperialista
A partir da reprodução desse texto na nossa página no Facebook, o companheiro André Alvarenga fez uma série de postagens em resposta a essa nossa publicação, nas quais expõe sua posição, diametralmente oposta à nossa, e busca embasá-la em argumentos e dados. Acreditamos poder resumir a tese do André Alvarenga da seguinte forma: ele defende que a China, não apenas é um país socialista (“caminho socialista de desenvolvimento da China”), mas também é o maior caso de sucesso da experiência socialista mundial (“resultados superiores a qualquer outro”), com um desenvolvimento inovador do marxismo (“economia socialista com concessões ao capital externo”), com a manutenção da classe trabalhadora no poder do Estado (“Estado permaneceu sob o poder da classe trabalhadora chinesa”), com subordinação do capital estrangeiro aos interesses do povo (“Estado Chinês usou o capital estrangeiro para o desenvolvimento de sua própria força produtiva, isto é, em benefício do seu próprio povo”), tudo isso refletido nas impressionantes taxas de crescimento econômico, sem crises (“China cresceu ao longo de todo esse período de maneira ininterrupta”), e no desenvolvimento de indicadores sociais (“China possui a maior proteção trabalhista do mundo”). 
Queremos agradecer ao André Alvarenga pela leitura do nosso texto, por seus comentários e pela exposição de sua posição, em tudo antagônica à nossa. E, principalmente, pela oportunidade para, a partir do choque entre escolas diferentes, desenvolvermos mais a nossa análise sobre um tema tão importante para a luta de classes quanto esse enigma chinês, incluindo pontos sobre os quais não havíamos nos manifestado anteriormente. 
No texto a seguir, buscamos identificar os principais pontos do André, expor suas teses e criticá-las de forma franca, aberta e radical, com os fatos existentes e nossa análise teórica e política marxista-leninista. 
Que Cem Flores Desabrochem! Que Cem Escolas Rivalizem!
Ponto 1
Crescente liberalização da propriedade privada na China? Como essa alegação lida com o fato de a propriedade estatal, pública e cooperativa ser dominante e estar passando por forte expansão nos últimos anos?
Uma vez que a exploração da indústria por singulares tinha como consequência necessária a propriedade privada, e que a concorrência não é mais do que o modo da exploração da indústria pelos proprietários privados individuais, a propriedade privada não pode ser separada da exploração individual da indústria nem da concorrência. A propriedade privada terá, portanto, igualmente de ser abolida e, em seu lugar, estabelecer-se-á a utilização comum de todos os instrumentos de produção e a repartição de todos os produtos segundo acordo comum, ou a chamada comunidade dos bens. A abolição da propriedade privada é mesmo a expressão mais breve e mais característica desta transformação de toda a ordem social necessariamente resultante do desenvolvimento da indústria, e por isso é com razão avançada pelos comunistas como reivindicação principal”. Engels. Princípios Básicos do Comunismo (Novembro de 1847)
Sobre esse ponto, o André não apresenta nenhum fato, apenas essa afirmação categórica. Em contraposição a ela, vamos mostrar as evidências que dispomos sobre o crescimento acelerado do papel da propriedade privada na China, em paralelo ao fortalecimento da burguesia chinesa, já reconhecendo, no entanto, o caráter limitado dessas evidências e a necessidade de reforçar nosso embasamento empírico. 
Mas antes, façamos um desvio teórico e político para mostrar como os modernos revisionistas (na verdade, “restauracionistas”) chineses tratam a questão da propriedade privada, do mercado e da concorrência, e a importância e a posição fundamental que atribuem a eles no âmbito das suas reformas econômicas para a restauração capitalista na China. Para isso, vamos nos basear no discurso do então secretário do Partido Comunista da China (PCCh), Jiang Zemin, no XIV Congresso Nacional do PCCh, em 1992, publicado pela revista Política Externa, volume 1, nº 4, março-abril-maio de 1993, pg. 146-181. 

quinta-feira, 21 de maio de 2020

O Estado*

Vírgínia Fontes**

   A questão do público relaciona-se diretamente às definições de Estado com as quais estaremos trabalhando. Se o Estado não se resume a um aparato técnico e neutro - como gostariam de nos fazer crer certos tecnocratas - nem ao "monopólio da violência legítima" como sugeriu Weber (concepção que segue o caminho clássico do pensamento liberal), é preciso, portanto, sair da dicotomização que ambas as concepções implicam, como se o Estado fosse uma entidade separada da sociedade, onde cada qual - Estado e sociedade - teria qualidades específicas e próprias.
Virgínia Fontes
   O Estado é, como o mostrou Marx(1), a forma pela qual se organiza a dominação social, dominação que encontra sua base na existência de classes sociais e que não existe historicamente a não ser de forma conflitiva e contraditória. Assim, analisar o Estado exige investigar as condições históricas da sua existência social, não podendo ele ser considerado como algo que encontrasse sua razão de ser em si próprio, numa racionalidade abstrata ou apenas na legitimação do uso da violência.
   Antonio Gramsci(2) aprofunda a análise, permitindo pensar as formas pelas quais ocorre uma ampliação do Estado à medida que o capitalismo se expande, devendo agora defrontar-se não apenas com os conflitos internos às frações das classes dominantes, mas também com as reivindicações e pressões dos grupos subalternos. Estado ampliado não significa, entretanto, alguma suposição de que este deixaria de ser de classes, como bem demonstrou N. Poulantzas(3). Estado ampliado supõe, em primeiro lugar, uma acomodação complexa dos interesses das diferentes frações das classes dominantes, o que se realiza espraiando-se numa crescente articulação entre o Estado e as formas associativas que os próprios grupos dominantes empreendem ("aparelhos privados de hegemonia"). Essa "ampliação" implica a produção de uma autonomia peculiar do Estado diante de cada uma dessas frações, sem a perda, entretanto, de seu caráter de classe; ao contrário, fortalece o caráter de classe do Estado, ao permitir que as medidas por ele encaminhadas revistam-se de uma caracterização como "interesse geral" ou "nacional". Essa ampliação atinge também os grupos subalternos, na medida em que o Estado passa a conter em seu seio demandas provenientes dos grupos sociais dominados, em estreita relação com sua capacidade de organização e de solidez de suas associações. Esse processo traduz-se na introdução de elementos de democratização - esparsos e tendencialmente subalternizados - e, por que não, de alguma dimensão pública, no âmbito do Estado.
   Trocando em miúdos, o Estado procura se apresentar como "técnico, neutro e acima dos interesses de cada grupo específico" em função de duas razões principais. A primeira, porque comporta um volume crescente de demandas contraditórias provenientes das próprias classes dominantes. Para assegurar o conjunto da dominação, para impedir que as lutas internas entre tais frações coloquem sob risco a própria dominação, o Estado permeia-se desses conflitos, incorporando-os como legítimos e necessários(4). A segunda, mais complexa, passa pela articulação entre essas disputas e as demais formas de organização social, seja porque frações das classes dominantes precisam convencer parcelas expressivas da população e apresentam-se como encarnações do verdadeiro "interesse nacional", seja porque as revoltas sociais tornam-se mais prementes e, portanto, impõem uma efetiva ampliação - publicização - desse Estado.

* Trecho de palestra proferida no NPC (Núcleo Piratininga de Comunicação) em 2002.
    Reflexões Im-pertinentes; Virgínia Fontes; p.181-183; Bom Texto Editora; 2005.

** Historiadora, doutora em Filosofia Política, professsora da UFF.

1 - Karl Marx e F. Engels, A Ideologia Alemã.

2 - A. Gramsci, Maquiavel a Política e o Estado Moderno.

3 - N. Poulantzas, O Estado, o Poder e o Socialismo.

4 - A instauração do chamado Estado liberal, com a implantação de formas representativas ao longo dos séculos XVIII e XIX, demonstra como é possível o estabelecimento de uma "democracia" de proprietários, contando com um efetivo espaço de disputa e de debate, ao lado do alijamento político da maioria da população. Ver, por exemplo, C.B. Macpherson, A democracia liberal: origens e evolução.




segunda-feira, 18 de maio de 2020

O Capitalismo

Ernest Mandel*
1981

   O capitalismo é um modo de produção fundado na divisão da sociedade em duas classes essenciais: a dos proprietários dos meios de produção (terra, matérias-primas, máquinas e instrumentos de trabalho) - sejam eles indivíduos ou sociedades - que compram a força de trabalho para fazer funcionar as suas empresas; a dos proletários, que são obrigados a vender a sua força de trabalho, porque eles não têm acesso direto aos meios de produção ou de subsistência, nem o capital que lhes permita trabalhar por sua própria conta.
Ernest Mandel
   O capitalismo não existe em lugar nenhum em estado puro. Ao lado dessas duas classes fundamentais vivem outras classes sociais. Nos países capitalistas industrializados, encontra-se a classe dos proprietários individuais de meios de produção e troca, que não exploram ou quase, mão-de-obra: pequenos artesãos, pequenos camponeses, pequenos comerciantes. Nos países do Terceiro Mundo, encontramos muitas vezes ainda proprietários fundiários semi-feudais, cujos rendimentos não provém da compra da força de trabalho, mas de formas mais primitivas de apropriação do sobre-trabalho, como a corveia ou a renda em espécie. Trata-se aí, porém, de classes que representam resquícios das sociedades pré-capitalistas, e não classes típicas do próprio capitalismo.


   O capitalismo não pode sobreviver e desenvolver-se senão quando estão reunidas as duas características fundamentais que acabamos de indicar: o monopólio de meios de produção em proveito de uma classe de proprietários privados; existência de uma classe separada dos meios de subsistência e de recursos que lhe permitam viver de outro modo que não pela venda da sua força de trabalho. O modo de produção capitalista reproduz constantemente as condições da sua própria existência.

A repartição do "valor acrescentado", do rendimento nacional, faz surgir, por um lado, uma acumulação de capitais (entre as mãos das empresas) que permite transformar em propriedade privada o essencial dos meios de produção e de troca recém-criados. Esta mesma repartição do rendimento nacional condena, por outro lado, a massa dos assalariados a só ganhar o que eles consomem, mesmo quando o seu nível de vida e de consumo sobem progressivamente; ela não lhes permite se transformarem em capitalistas, isto é, em indivíduos trabalhando por sua própria conta.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Nem com Lupa!

Ney Nunes 

     A denominada “Marcha sobre o Supremo Tribunal Federal”, realizada no dia 07/5, por uma comitiva de industriais¹ sob a liderança do presidente Bolsonaro e do seu ministro da economia Paulo Guedes, teve o objetivo declarado de pressionar os ministros do STF com relação às medidas restritivas adotadas por governadores e prefeitos face à pandemia do coronavírus.  O ato deixou evidente, mais uma vez, o alinhamento desse setor da burguesia com o que existe de mais reacionário no cenário político brasileiro.     


A marcha genocida dos industriais com Bolsonaro e Guedes.

   Só um grau muito elevado de ingenuidade ou de má-fé, pode explicar a persistência, entre aqueles que se reivindicam de “esquerda”, do antigo discurso colocando em campos opostos o chamado “capital financeiro” (banqueiros, rentistas e especuladores) e o “capital produtivo” (indústria, agronegócio e serviços). Segundo eles, o primeiro, seria reacionário e entreguista, já o segundo, teria um perfil nacionalista e progressista.

     Faz sessenta anos que essa dicotomia, seguindo a tendência histórica do desenvolvimento capitalista, perdeu qualquer validade no Brasil. No final da década de 1950 se cristalizou uma aliança estratégica entre estes dois setores. Aliança que, sob os auspícios do imperialismo norte-americano, iria desaguar no golpe empresarial-militar de 1964.² A partir daí, a conjugação de interesses avançou, até chegarmos a perfeita simbiose atual entre os setores burgueses hegemonizados pelo capital financeiro.

     Não sobreviveu nenhum projeto nacional, democrático, desenvolvimentista, que esteja amparado em qualquer setor importante da burguesia brasileira. O projeto hegemônico não contempla nada que não esteja inserido na associação, obviamente subalterna, com os ditames econômicos e políticos do imperialismo.

     Ao alinharem-se com a política do governo Bolsonaro, os industriais prosseguem no curso da aliança que fomentou o golpe de 1964. Sabedores de que, na atual fase do capitalismo, necessitam intensificar a exploração dos trabalhadores em níveis similares ao começo do século passado e que o exército reserva de mão-de-obra no Brasil excede em muito as necessidades empresariais³, não hesitaram em promover a marcha genocida sobre o STF, sob a batuta do presidente neofascista e do ministro representante do “Deus Mercado”.

     Nem com lupa se encontram vestígios de progressismo entre os industriais brasileiros, mas, por incrível que pareça, decorridos sessenta anos, ainda há quem insista nessa procura inútil.

   
¹ José Ricardo Roriz Coelho, da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria de Plástico);
Fernando Valente Pimentel, da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção);
José Velloso Dias Cardoso, da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos);
Paulo Camilo Penna, presidente do Snic (Sindicato Nacional da Indústria do Cimento);
Elizabeth de Carvalhaes, da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa);
Synesio Batista da Costa, da Abrinq;
Haroldo Ferreira, da Abicalçados (Associação Brasileira da Indústria de Calçados);
Ciro Marino, da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química);
José Jorge do Nascimento Junior, da Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos);
José Rodrigues Martins, da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção);
Reginaldo Arcuri, da FarmaBrasil;
José Augusto de Castro, da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil);
Marco Polo de Mello Lopes, da Coalizão Indústria;
Humberto Barbato, da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica);
Um Representante da Anfavea.

² René Armand Dreifuss; 1964: A Conquista do Estado; p.93. “As associações de classe: As novas condições de desenvolvimento durante a década de cinquenta e o fato de os empresários multinacionais e associados haverem percebido os seus interesses comuns na modernização do país, assim como a necessidade do estabelecimento de canais apropriados para sua crescente penetração, estimularam a rápida expansão da estrutura associativa e a procura de novas formas de organização de interesses. (...)
   Três dos mais importantes focos de pressão política onde predominavam os interesses multinacionais e associados eram a então renovada Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – FIESP, e sua organização idêntica CIESP, Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (às quais estava ligado o fórum de debate Roberto Simonsen), a Federation of the American Chambers of Commerce do Brasil e o CONCLAP, Conselho Nacional das Classes Produtoras.”






segunda-feira, 11 de maio de 2020

A Bandeira Vermelha em Tempos de Coronavírus


Ângeles Maestro [*]
08/Maio/2020

A entrada do Exército Vermelho em Berlim, fixada na poderosa imagem do soldado pendurando a Bandeira Vermelha no Reichstag, marcou não só o fim da Segunda Guerra Mundial, mas também a ilustração de quais foram as forças decisivas capazes de derrotar o monstro nazi, engendrado pelo próprio capitalismo em crise.


Soldados do Exército Vermelho hastearam a bandeira vermelha  no prédio do Parlamento alemão, o Reichstag.
A devastadora experiência da invasão alemã, juntamente com a memória viva da Revolução de Outubro e da subsequente vitória contra toda a reação internacional permitiram ao povo soviético entender qual é exatamente o dilema formulado por Rosa Luxemburgo, " Socialismo ou Barbárie " e em que medida a defesa da vida e a luta pelo socialismo são uma e a mesma coisa. Assim se construiu a mais heroica saga de todos os tempos.

Há outra imagem intimamente ligada à anterior, menos conhecida e até ocultada, mas que tem as mesmas raízes. No campo de extermínio de  Mauthausen , em junho de 1941, ou seja, alguns dias após o ataque nazi à URSS, quando para aqueles que ali estavam presos parecia não haver aspirações futuras, criou-se a organização clandestina dos comunistas espanhóis nesse campo. À noite, nus, aproveitando o facto de os terem juntado no pátio para uma desinfeção, no lugar programado para aniquilar toda a esperança, tomam-se as primeiras decisões para criar a estrutura que, quatro anos depois, permitiria a libertação do campo pelos próprios prisioneiros.

Foi essa vontade inquebrantável de lutar e ter esperança, juntamente com a assunção da responsabilidade de cada um na tarefa coletiva de preparar o necessário parto de uma nova sociedade, que coloque como objetivo central o desenvolvimento de todas as capacidades de todos os seres humanos, que tornaram possível a vitória da URSS e tantas gestas ocultadas, como a de  Mauthausen.

Hoje, quando nos depauperados  hospitais os doentes se amontoam devido à falta de recursos que foram engolidos pelo capital privado e quando há milhões de pessoas que perderam o seu emprego, enquanto se delapida a vitalidade, a inteligência e a criatividade daqueles que não têm recursos para as desenvolver, nestes difíceis momentos, a bandeira vermelha no Reichstag é a mais contundente afirmação de esperança no futuro. Porque a infeção é causada pelo coronavírus, mas a epidemia é o capitalismo.

Os processos revolucionários que, por diferentes razões, se desviaram dos seus objetivos iniciais, não morreram. Sobrevivem na memória e no coração dos seus povos e de todos os oprimidos no mundo. E o mais importante de tudo não são as derrotas, mas as tentativas temporariamente falhadas no inevitável caminho para derrotar a barbárie capitalista e iluminar a verdadeira História da humanidade.

[*] Médica, dirigente da Red Roja espanhola.
Fonte: https://resistir.info/pandemia/angeles_08mai20.html
Edição: Página 1917.

O papel internacional da China*

Elisseos Vagenas**
Publicado em 2010.


   A ascensão de uma nova potência global, a China, tem provocado grande interesse para analistas e trabalhadores comuns em todo o mundo. Esse interesse é ainda mais intenso entre pessoas politizadas, que entendem a era de revoluções sociais que começou com a de Outubro de 1917 na Rússia, e que acarretou em uma série de importantes lutas e revoluções sociopolíticas em todo o mundo – entre elas, a Revolução Chinesa. O interesse em relação ao crescimento do poder da China é contraditório, uma vez que o aumento de seu poder está ocorrendo sob a bandeira vermelha e com o Partido Comunista da China no poder.
Em 1949 a Revolução Socialistas foi vitoriosa na China.
   No entanto, uma das “lições” da contrarrevolução na União Soviética é que os comunistas não deveriam ter aceitado inquestionavelmente o que o PCUS (Partido Comunista da União Soviética) dizia, mas que todo PC, embora fiel ao princípio do internacionalismo proletário, deveria estudar com seus próprios recursos os desenvolvimentos e a experiência do movimento comunista internacional, e tentar formular sua própria opinião sobre esses assuntos, utilizando do marxismo-leninismo como sua ferramenta. O KKE reserva seu direito de crítica dentro do movimento comunista internacional, com o objetivo tanto de fortalecê-lo, como também de fortalecer a estratégia dos comunistas. O KKE confronta desvios dos princípios do marxismo-leninismo e das leis da construção socialista, mantendo ao mesmo tempo relações bilaterais com partidos comunistas que possuem abordagens diferentes.
   Neste sentido, o KKE, embora continue mantendo relações bilaterais com o PCC (Partido Comunista da China), acompanha sistematicamente os desenvolvimentos e formula suas próprias avaliações, que expressa tanto publicamente, como ao PCC. Como é sabido, o KKE já em seu 17º Congresso (2005) observou a expansão das relações capitalistas na China. Desde então, essa tendência tem sido reforçada e é ainda mais evidente.

domingo, 10 de maio de 2020

Para onde vai a China?*

Artigo publicado em Política Operária, 2007.


Francisco Martins Rodrigues**

   O n° 78 da revista Études Marxistes, do Partido do Trabalho da Bélgica, é inteiramente preenchido com um bem documentado artigo intitulado “O desenvolvimento do socialismo na China”. Como o título já deixa perceber, o balanço do autor é francamente otimista. Acha que o “socialismo” está a avançar na China e que o PC Chinês continua “fiel” ao marxismo.
Protesto de operárias na China, em 2012.
   Porquê? Pela razão que deixa embevecidos todos os progressistas distraídos — o crescimento fenomenal da China, o avanço por saltos na economia, no nível de vida, na saúde, no ensino. Mas isso, só por si, não prova nada quanto a socialismo. Há três quartos de século também os progressistas, espantados perante a cavalgada da industrialização e da mecanização agrícola na União Soviética, esqueciam-se de perguntar quem estava no poder. Para o senso comum, a equação governo “comunista” + nacionalizações + desenvolvimento econômico = socialismo parece indiscutível. Só que há ainda o outro fator a ter em conta: qual a classe que realmente exerce o poder?***

   A verdade é que eles não querem saber desse pormenor da ditadura do proletariado inexistente. Não há sinais de poder das massas e há muitos sinais de poder dos capitalistas na China? O partido comunista está penetrado pelo espírito do negócio e do lucro? A propaganda sobre a “harmonia social” não consegue disfarçar as contradições de classe que crescem exponencialmente? Não faz mal. Pois não é o próprio PCC que reconhece estar ainda na “primeira fase do socialismo”? Logo, está tudo justificado.

   Como, apesar de tudo, não se pode ignorar as realidades brutais da sociedade chinesa, o autor do artigo lamenta, com ingenuidade postiça: “Porque permite o PCC que se desenvolva um importante sector privado, chinês e multinacional? Não se corre o risco de esvaziar pouco a pouco o socialismo da sua substância?” O “risco” de “esvaziar pouco a pouco o socialismo”... Boa piada!

   O crescimento da China é positivo no equilíbrio de forças mundial porque pode neutralizar a agressividade do imperialismo americano. Ao povo chinês, ao povo dos EUA, aos povos de todo o mundo, convém que o regime chinês se oponha ao imperialismo. Mas só um marxismo de meia tigela confunde isto com socialismo.

   Apetece recordar a advertência de Mao em Maio de 1966:Os representantes da burguesia que se infiltraram no Partido Comunista negam a necessidade da ditadura do proletariado contra a burguesia. São servidores leais da burguesia e do imperialismo. Esforçam-se por manter a ideologia burguesa de opressão e exploração do proletariado. São um bando de contra-revolucionários que estão contra o Partido Comunista e o povo. Os representantes da burguesia que se infiltraram no partido, no governo, no exército e nos setores culturais são um bando de revisionistas contra-revolucionários. Se lhes dermos ocasião, transformarão a ditadura do proletariado em ditadura da burguesia. A luta deles contra nós é uma luta de morte. Por isso a nossa luta contra eles deve ser também uma luta de morte.”

   O comité central esclareceu depois que isto era um exagero e que havia apenas “pontos de vista diferentes sobre a maneira de construir o socialismo”. Como se viu.

* Fonte:  https://anabarradas.com/   
             
** Militante revolucionário, de longa data, foi membro do CC do Partido Comunista Português e viria a romper com o seu reformismo por altura da polêmica sino-soviética, fundando a FAP e o CMLP, a primeira organização marxista-leninista portuguesa. Foi o primeiro a introduzir em Portugal de uma forma organizada as lições da revolução chinesa e o exemplo de Mao Tsétung. Preso várias vezes e barbaramente torturado pela PIDE, manteve-se ao longo de toda a sua vida do lado da Revolução e empenhado na organização de uma corrente comunista revolucionária. O 25 de Abril de 1974 apanhou o camarada "Chico" na prisão e os militares "democratas" do MFA tentaram mantê-lo preso. Só a forte vontade popular e grandes manifestações à porta da prisão o conseguiram libertar. A partir de 1985 e até morrer em 2008 foi diretor da revista "Política Operária", que também fundou.
É em nome da pureza do papel do operariado que, em 1984, abandona o PCP (R) e a UDP, acusando os outros dirigentes de cedências à pequena burguesia. Escreve então o livro "Anti-Dimitrov. 1935-1985 meio-século de derrotas da Revolução" (1985), onde sistematiza a sua crítica ao dimitrovismo, ao estalinismo e ao maoismo. Funda a "Política Operária", a sua última revista, que manteve praticamente até à morte.

*** Todos os grifos são nossos, Página 1917.










segunda-feira, 4 de maio de 2020

Como Forjar um Partido Bolchevique.*

É Preciso arrancar as Massas aos Social-Democratas
Ossip Piatnitsky**

As formas bolcheviques e social-democratas
de organização do Partido.

Até 1905 não houve na Rússia czarista eleições nem campanha eleitoral. Nem os camponeses nem os operários participavam das eleições dos zemstvos ou das municipalidades urbanas. Não possuíam o direito de voto. Depois de 1905, quando, em razão das eleições para a Duma se elaboraram condições especiais para os operários, foram criadas divisões especiais e os operários votavam por empresa e por fábrica.
Ossip Piatnitsky, dirigente da III Internacional Comunista.
Uma situação ilegal de todos os partidos até 1905, uma ausência de campanhas eleitorais e ao mesmo tempo (o qual é essencial) uma posição justa dos bolcheviques na questão da organização do Partido (o recrutamento para o Partido de operários de fábricas e de empresas, a criação de círculos de estudos políticos e gerais, tais foram na Rússia czarista as particularidades da formação do Partido bolchevique. A situação ilegal do Partido bolchevique, além das razões já mencionadas, o impulsionava a criar os grupos do Partido nas empresas, pelo fato de que era mais fácil e cômodo militar. A edificação do Partido começou, pois, nas fábricas e nas empresas. Isso deu brilhantes resultados, tanto nos anos de reação e depois da revolução de fevereiro como, particularmente, no curso da revolução de outubro, em 1917, da guerra civil e da grande construção do socialismo.

Durante a reação, depois de 1908, quando os comitês locais do Partido e sua direção (o Comitê Central) eram aniquilados periodicamente, nem por isso sua base deixava de se manter firme nas fábricas e empresas. As células do Partido continuavam a ação. Depois da revolução de fevereiro, as eleições dos soviets de deputados operários também eram realizadas por fábrica e por empresa. É importante destacar que as eleições para as dumas das cidades e bairros e para a Assembléia Constituinte tinham lugar não por empresa, mas por domicílio dos eleitores. Mesmo assim, depois das revoluções de fevereiro e de outubro o Partido bolchevique obteve os mesmos êxitos apesar de não ter organizações de bairro e de concentrar sua agitação nas empresas e nos quartéis. As células, os comitês de zona, e os comitês de cidade fizeram a campanha eleitoral sem constituir organizações especiais para as eleições por bairro. O Partido Bolchevique sempre tinha suas organizações de base no local de trabalho de seus membros.

Outra coisa ocorria no estrangeiro. Ali as eleições ocorriam não por empresa, mas por distrito, pelo domicílio dos eleitores. A tarefa principal que os partidos socialistas se propunham era de organizar bem a campanha eleitoral e de lutar pela cédula eleitoral. Por esta razão, o Partido estava igualmente organizado no local de habitação de seus membros, a fim de facilitar seu agrupamento para realizar a campanha nas circunscrições eleitorais.

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