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quarta-feira, 13 de maio de 2020

Nem com Lupa!

Ney Nunes 

     A denominada “Marcha sobre o Supremo Tribunal Federal”, realizada no dia 07/5, por uma comitiva de industriais¹ sob a liderança do presidente Bolsonaro e do seu ministro da economia Paulo Guedes, teve o objetivo declarado de pressionar os ministros do STF com relação às medidas restritivas adotadas por governadores e prefeitos face à pandemia do coronavírus.  O ato deixou evidente, mais uma vez, o alinhamento desse setor da burguesia com o que existe de mais reacionário no cenário político brasileiro.     


A marcha genocida dos industriais com Bolsonaro e Guedes.

   Só um grau muito elevado de ingenuidade ou de má-fé, pode explicar a persistência, entre aqueles que se reivindicam de “esquerda”, do antigo discurso colocando em campos opostos o chamado “capital financeiro” (banqueiros, rentistas e especuladores) e o “capital produtivo” (indústria, agronegócio e serviços). Segundo eles, o primeiro, seria reacionário e entreguista, já o segundo, teria um perfil nacionalista e progressista.

     Faz sessenta anos que essa dicotomia, seguindo a tendência histórica do desenvolvimento capitalista, perdeu qualquer validade no Brasil. No final da década de 1950 se cristalizou uma aliança estratégica entre estes dois setores. Aliança que, sob os auspícios do imperialismo norte-americano, iria desaguar no golpe empresarial-militar de 1964.² A partir daí, a conjugação de interesses avançou, até chegarmos a perfeita simbiose atual entre os setores burgueses hegemonizados pelo capital financeiro.

     Não sobreviveu nenhum projeto nacional, democrático, desenvolvimentista, que esteja amparado em qualquer setor importante da burguesia brasileira. O projeto hegemônico não contempla nada que não esteja inserido na associação, obviamente subalterna, com os ditames econômicos e políticos do imperialismo.

     Ao alinharem-se com a política do governo Bolsonaro, os industriais prosseguem no curso da aliança que fomentou o golpe de 1964. Sabedores de que, na atual fase do capitalismo, necessitam intensificar a exploração dos trabalhadores em níveis similares ao começo do século passado e que o exército reserva de mão-de-obra no Brasil excede em muito as necessidades empresariais³, não hesitaram em promover a marcha genocida sobre o STF, sob a batuta do presidente neofascista e do ministro representante do “Deus Mercado”.

     Nem com lupa se encontram vestígios de progressismo entre os industriais brasileiros, mas, por incrível que pareça, decorridos sessenta anos, ainda há quem insista nessa procura inútil.

   
¹ José Ricardo Roriz Coelho, da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria de Plástico);
Fernando Valente Pimentel, da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção);
José Velloso Dias Cardoso, da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos);
Paulo Camilo Penna, presidente do Snic (Sindicato Nacional da Indústria do Cimento);
Elizabeth de Carvalhaes, da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa);
Synesio Batista da Costa, da Abrinq;
Haroldo Ferreira, da Abicalçados (Associação Brasileira da Indústria de Calçados);
Ciro Marino, da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química);
José Jorge do Nascimento Junior, da Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos);
José Rodrigues Martins, da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção);
Reginaldo Arcuri, da FarmaBrasil;
José Augusto de Castro, da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil);
Marco Polo de Mello Lopes, da Coalizão Indústria;
Humberto Barbato, da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica);
Um Representante da Anfavea.

² René Armand Dreifuss; 1964: A Conquista do Estado; p.93. “As associações de classe: As novas condições de desenvolvimento durante a década de cinquenta e o fato de os empresários multinacionais e associados haverem percebido os seus interesses comuns na modernização do país, assim como a necessidade do estabelecimento de canais apropriados para sua crescente penetração, estimularam a rápida expansão da estrutura associativa e a procura de novas formas de organização de interesses. (...)
   Três dos mais importantes focos de pressão política onde predominavam os interesses multinacionais e associados eram a então renovada Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – FIESP, e sua organização idêntica CIESP, Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (às quais estava ligado o fórum de debate Roberto Simonsen), a Federation of the American Chambers of Commerce do Brasil e o CONCLAP, Conselho Nacional das Classes Produtoras.”






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