Charles Bettelheim
Novembro/1971
O marxismo-leninismo é a teoria do
proletariado porque é a expressão teórica da existência do proletariado no modo
de produção capitalista: o marxismo desenvolveu-se colocando-se do ponto de
vista do proletariado, único ponto de vista a partir do qual é possível
compreender o significado das lutas proletárias. Devem recordar-se aqui as
palavras de Marx, que, ao analisar o alcance histórico da Comuna de Paris,
declarava que, para a burguesia e para os que se colocam na posição desta, o
sentido das lutas proletárias de classe é uma “esfinge”, ou seja, um “enigma”.
O marxismo e o leninismo partem não só das
lutas proletárias de classe, mas também de uma análise das contradições objetivas
do modo de produção capitalista, do estabelecimento da especificidade da posição
do proletariado neste modo de produção. Esta posição é a de uma classe
produtora inteiramente desprovida de meios de produção, totalmente separada das
suas condições de existência pelo processo de reprodução capitalista, de uma
classe que só se pode libertar da exploração capitalista se suprimir não só o capitalismo,
mas todas as formas de exploração do homem pelo homem, destruindo totalmente as
relações sociais existentes e substituindo-as por relações radicalmente novas.
A especificidade da posição do
proletariado no modo de produção capitalista obriga-o, para se libertar, a
desenvolver uma ideologia revolucionária radical. Com efeito, a libertação do
proletariado da exploração e da opressão exige a sua radicalização ideológica,
a sua adesão crescente a uma ideologia completamente revolucionária que é
fundamentalmente a sua, diferente daquela a que a enorme pressão dos aparelhos
ideológicos da burguesia tende permanentemente a submetê-lo.(5)
A ideologia proletária é a que corresponde
à posição do proletariado no modo de produção capitalista; esta ideologia é o
marxismo-leninismo, que, precisamente, se desenvolveu e se desenvolve a partir
de uma análise da posição objetiva do
proletariado, a partir de uma tomada em consideração das contradições no seio
das quais se desenvolve espontaneamente a luta proletária de classe e das
posições que espontaneamente toma o proletariado todas as vezes que as suas
próprias lutas atingem uma certa intensidade.
É neste sentido muito preciso que o
marxismo-leninismo é a teoria revolucionária do proletariado. É por esta razão
que ele tem a capacidade de penetrar com uma velocidade avassaladora na classe
operária todas as vezes que as contradições objetivas em que o proletariado é
envolvido atingem uma certa acuidade. É também por esta razão que, todas as
vezes que as lutas proletárias de classe atingem uma certa intensidade, o
proletariado encontra por si mesmo formas de organização de massa que Marx e
Lenin mostraram corresponderem ao papel revolucionário do proletariado: estas
formas de organização são as da Comuna de Paris, dos Sovietes de 1905 e de
1917, dos Comités Revolucionários num grande número de países e nomeadamente na
China durante a Revolução Cultural.
Ao mesmo tempo, a natureza das
contradições em que o proletariado é envolvido explica que estas formas de
organização, que podem designar-se pelo termo de “realização espontânea da
ideologia proletária”, sejam por si sós instáveis e frágeis, donde a
necessidade da construção de um aparelho ideológico e político especificamente
proletário, de um partido marxista-leninista portador da ideologia proletária.
Só um tal aparelho permite, ao mesmo tempo, concentrar as iniciativas das
massas que correspondem às exigências da libertação das classes dominadas de
todas as formas de exploração e de opressão e permite que estas classes,
através das lutas que travam, se apropriem da ideologia proletária de que a ação
da burguesia tende permanentemente a separá-las. Como o sublinha Marx, é
através das lutas revolucionárias e só através destas lutas que o proletariado
consegue transformar-se a si próprio ideologicamente. Tal como ele escreve na
Ideologia Alemã: “...A revolução não é necessária apenas porque não há outros
meios de derrubar a classe dominante, mas ainda porque a classe que derruba a
outra só por uma revolução pode conseguir desembaraçar-se de toda a velha
mixórdia e tornar-se assim capaz de realizar uma nova fundação da sociedade.”(6)
O marxismo-leninismo é a teoria
revolucionária do proletariado porque tira até ao fim as conclusões que a
análise das lutas do proletariado e da posição deste no modo de produção
capitalista impõe, quando nos colocamos do ponto de vista dos explorados e não
do ponto de vista dos exploradores. O marxismo-leninismo pôde assim mostrar, ao
mesmo tempo, o papel radicalmente revolucionário do proletariado e o carácter
histórico mundial da revolução proletária, carácter este ligado ao
desenvolvimento do modo de produção capitalista como um sistema mundial de
exploração e de opressão de que os povos só à escala mundial podem
definitivamente libertar-se.
Notas:
5 - A Ideologia a que o proletariado está
deste modo submetido não é evidentemente a ideologia do proletariado, mas sim a
que sobre ele pesa ou, como diz Rivenc num texto não publicado sobre «A
filosofia de Mao Tsé-tung», «a ideologia entre o proletariado».
6 - Cf. K. Marx, A Ideologia
Alemã, citação de acordo com: Marx, Oeuvres philosophiques, Ed. Costes, t. VI,
p. 184.
Edição: Página 1917
Fonte: Sociedades de
Transição: Luta de Classes e Ideologia Proletária; Paul Sweezy e Charles
Bettelheim.
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