Índice de Seções

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

O Marxismo-Leninismo Como Teoria do Proletariado

Charles Bettelheim

Novembro/1971

 


     O marxismo-leninismo é a teoria do proletariado porque é a expressão teórica da existência do proletariado no modo de produção capitalista: o marxismo desenvolveu-se colocando-se do ponto de vista do proletariado, único ponto de vista a partir do qual é possível compreender o significado das lutas proletárias. Devem recordar-se aqui as palavras de Marx, que, ao analisar o alcance histórico da Comuna de Paris, declarava que, para a burguesia e para os que se colocam na posição desta, o sentido das lutas proletárias de classe é uma “esfinge”, ou seja, um “enigma”.

     O marxismo e o leninismo partem não só das lutas proletárias de classe, mas também de uma análise das contradições objetivas do modo de produção capitalista, do estabelecimento da especificidade da posição do proletariado neste modo de produção. Esta posição é a de uma classe produtora inteiramente desprovida de meios de produção, totalmente separada das suas condições de existência pelo processo de reprodução capitalista, de uma classe que só se pode libertar da exploração capitalista se suprimir não só o capitalismo, mas todas as formas de exploração do homem pelo homem, destruindo totalmente as relações sociais existentes e substituindo-as por relações radicalmente novas.

     A especificidade da posição do proletariado no modo de produção capitalista obriga-o, para se libertar, a desenvolver uma ideologia revolucionária radical. Com efeito, a libertação do proletariado da exploração e da opressão exige a sua radicalização ideológica, a sua adesão crescente a uma ideologia completamente revolucionária que é fundamentalmente a sua, diferente daquela a que a enorme pressão dos aparelhos ideológicos da burguesia tende permanentemente a submetê-lo.(5)

     A ideologia proletária é a que corresponde à posição do proletariado no modo de produção capitalista; esta ideologia é o marxismo-leninismo, que, precisamente, se desenvolveu e se desenvolve a partir de uma análise da posição objetiva  do proletariado, a partir de uma tomada em consideração das contradições no seio das quais se desenvolve espontaneamente a luta proletária de classe e das posições que espontaneamente toma o proletariado todas as vezes que as suas próprias lutas atingem uma certa intensidade.

     É neste sentido muito preciso que o marxismo-leninismo é a teoria revolucionária do proletariado. É por esta razão que ele tem a capacidade de penetrar com uma velocidade avassaladora na classe operária todas as vezes que as contradições objetivas em que o proletariado é envolvido atingem uma certa acuidade. É também por esta razão que, todas as vezes que as lutas proletárias de classe atingem uma certa intensidade, o proletariado encontra por si mesmo formas de organização de massa que Marx e Lenin mostraram corresponderem ao papel revolucionário do proletariado: estas formas de organização são as da Comuna de Paris, dos Sovietes de 1905 e de 1917, dos Comités Revolucionários num grande número de países e nomeadamente na China durante a Revolução Cultural.

     Ao mesmo tempo, a natureza das contradições em que o proletariado é envolvido explica que estas formas de organização, que podem designar-se pelo termo de “realização espontânea da ideologia proletária”, sejam por si sós instáveis e frágeis, donde a necessidade da construção de um aparelho ideológico e político especificamente proletário, de um partido marxista-leninista portador da ideologia proletária. Só um tal aparelho permite, ao mesmo tempo, concentrar as iniciativas das massas que correspondem às exigências da libertação das classes dominadas de todas as formas de exploração e de opressão e permite que estas classes, através das lutas que travam, se apropriem da ideologia proletária de que a ação da burguesia tende permanentemente a separá-las. Como o sublinha Marx, é através das lutas revolucionárias e só através destas lutas que o proletariado consegue transformar-se a si próprio ideologicamente. Tal como ele escreve na Ideologia Alemã: “...A revolução não é necessária apenas porque não há outros meios de derrubar a classe dominante, mas ainda porque a classe que derruba a outra só por uma revolução pode conseguir desembaraçar-se de toda a velha mixórdia e tornar-se assim capaz de realizar uma nova fundação da sociedade.”(6)

     O marxismo-leninismo é a teoria revolucionária do proletariado porque tira até ao fim as conclusões que a análise das lutas do proletariado e da posição deste no modo de produção capitalista impõe, quando nos colocamos do ponto de vista dos explorados e não do ponto de vista dos exploradores. O marxismo-leninismo pôde assim mostrar, ao mesmo tempo, o papel radicalmente revolucionário do proletariado e o carácter histórico mundial da revolução proletária, carácter este ligado ao desenvolvimento do modo de produção capitalista como um sistema mundial de exploração e de opressão de que os povos só à escala mundial podem definitivamente libertar-se.

Notas:

 5 - A Ideologia a que o proletariado está deste modo submetido não é evidentemente a ideologia do proletariado, mas sim a que sobre ele pesa ou, como diz Rivenc num texto não publicado sobre «A filosofia de Mao Tsé-tung», «a ideologia entre o proletariado».

6 - Cf. K. Marx, A Ideologia Alemã, citação de acordo com: Marx, Oeuvres philosophiques, Ed. Costes, t. VI, p. 184.

Edição: Página 1917

Fonte: Sociedades de Transição: Luta de Classes e Ideologia Proletária; Paul Sweezy e Charles Bettelheim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Caro leitor, ajude a divulgar o Página 1917, compartilhe nossas publicações nas suas redes sociais.