*Artigo da Seção de Relações Internacionais do CC do Partido Comunista da Grécia (KKE) sobre a recente teleconferência internacional dos Partidos Comunistas
O reflexo do debate político-ideológico no
Movimento Comunista Internacional
É claro que questões
político-ideológicas importantes continuam a atormentar o movimento comunista
internacional. Cabe dizer que dos encontros internacionais participam partidos
como o Partido Comunista Francês e o Partido Comunista Espanhol, que tiveram um
papel de liderança na corrente oportunista do chamado
"Eurocomunismo", assim como outros partidos que participam do “pilar”
do centro oportunista europeu atual, o chamado “European Left” (Partido da Esquerda
Europeia) e o GUE/NGL, o grupo europeu de "esquerdas" no Parlamento
Europeu, que, como temos avaliado, chegou a funcionar como um tipo de
representação do European Left no Parlamento
Europeu. Inclusive participam partidos que rejeitaram o marxismo-leninismo, a
foice e o martelo, e a construção do socialismo na URSS.
O debate sobre a questão da participação nos
governos burgueses
A questão da participação
ou apoio dos partidos comunistas em governos “de esquerda”, “progressistas” que
surgem no âmbito da gestão do capitalismo continua sendo um ponto-chave na
polêmica política-ideológica. Em primeiro lugar, porque os partidos que têm
essa posição política com construções ideológicas diversas como a
"humanização" do capitalismo, a "democratização" da UE ou
as "etapas rumo ao socialismo", a chamada "ruptura com a política
da direita” alimentam ilusões sobre a gestão do sistema. Eles estão lavando o papel sujo da socialdemocracia e focando suas críticas em uma forma de gestão
burguesa, o neoliberalismo. Tais forças ignoram e subestimam as leis que regem
a economia capitalista e o caráter concreto e irreversivelmente reacionário do
Estado burguês que não é anulado por nenhuma forma de gestão burguesa. Essas
forças remetem a luta pelo socialismo para uma “perspectiva de longo prazo” e
na prática assumem grandes responsabilidades perante os povos, pois se recusam
a realizar o trabalho árduo diário de agrupar forças sociais que se chocam com
os monopólios e o capitalismo.
Portanto, vemos que eles
se concentram em soluções de gestão governamental, votando a favor até de
gastos militares destinados às necessidades da OTAN, as missões imperialistas
por exemplo na zona do Sahel, ou substituindo a demanda pela retirada do país
da OTAN pela demanda por sua "dissolução" indefinida e abstrata. O
resultado de tal política pode ser visto na Espanha, onde o Partido Comunista
da Espanha participa de um governo que está gerenciando a pandemia de maneira
bárbara e antipopular, está tomando novas medidas antioperárias com base nas
orientações da UE, ao mesmo tempo em que atinge o ponto de tomar medidas para prejudicar
Cuba e, claro, participar dos planos da OTAN
A confusão em torno do conceito de imperialismo
Basicamente são as mesmas
forças que tratam o imperialismo não com critérios leninistas, ou seja, como
capitalismo em sua fase de monopólio, mas meramente como uma política externa
agressiva. Assim, eles ignoram que em nosso tempo os monopólios, os estados
capitalistas e suas alianças estão em conflito por matérias-primas, energia,
recursos minerais, rotas de transporte, fatias de mercado. Ainda mais porque
alguns partidos rejeitam o fato de que o antagonismo entre os monopólios seja a
base para o acirramento das contradições em escala internacional.
Nessa questão, esses
partidos se concentram na política externa agressiva dos EUA, da OTAN e de
outras potências fortes, interpretando unilateralmente a “agressão
imperialista” e propondo o chamado “mundo multipolar” como solução. No entanto,
a posição que limita o imperialismo apenas aos EUA, bem como a posição de que a
coexistência de muitos “polos” internacionais onde um polo controlará o outro,
resultando em um “mundo pacífico”, é completamente desorientadora para os
povos. Está escondendo a realidade. Está fomentando ilusões de que pode haver
um imperialismo "não agressivo", um suposto capitalismo “amante da
paz".
O KKE e os demais partidos
criticaram visões similares que foram apresentadas no século passado, tanto por
forças oportunistas na Europa, quanto pelo PCUS, especialmente após sua virada
oportunista em seu XX Congresso, quando prevaleceu a linha da “competição
pacífica” dos dois sistemas sociopolíticos
A cooperação “antifascista” com as forças burguesas
Alguns partidos ficam
confusos pelo fato de o sistema capitalista em vários casos usar o cão de
guarda do sistema, ou seja, várias forças fascistas e usá-las para promover
vários planos das classes burguesas, como aconteceu na Ucrânia. Mesmo algumas
forças que reconhecem que o fascismo "nasce e se cria" no capitalismo
tendem a separar essa questão da luta contra o capitalismo; levam à percepção
de cooperação “antifascista” com certas forças burguesas ou mesmo ao seu apoio.
Hoje, no que diz respeito
aos eventos internacionais, destaca-se a extrema importância da avaliação do
KKE como resultado do estudo da História da Segunda Guerra Mundial. Que esta
guerra foi imperialista e injusta tanto para as potências capitalistas
fascistas quanto para os países capitalistas "democráticos", que
também cometeram grandes crimes contra a humanidade, como o bombardeio nuclear
de Hiroshima e Nagasaki. Que esta guerra foi justa apenas para a URSS e os
movimentos de guerrilha e libertação popular nos países ocupados, onde os
comunistas desempenharam um papel fundamental.
Essa posição está
diretamente relacionada ao presente, à manifestação das contradições
interimperialistas na Ucrânia, quando os EUA, a OTAN e a UE usam as forças
fascistas na Ucrânia para seus planos geopolíticos e, por outro lado, a Rússia
capitalista promove os interesses de seus próprios monopólios. É óbvio que os
EUA, as alianças imperialistas da OTAN e da UE, bem como as classes burguesas
que as constituíram, têm grandes responsabilidades em relação a esses
acontecimentos. Ao mesmo tempo, a burguesia russa também tem enormes
responsabilidades pela situação atual. Todos que atualmente pertencem a essa
buruesia, tiveram um papel de liderança na dissolução da URSS. O 30º
aniversário da sua dissolução foi recentemente celebrado. Então, Yeltsin e as
forças sociais e políticas que o seguiram se preocupavam em derrubar a URSS, eles
não estavam interessados, por exemplo, no que iria acontecer com a Crimeia,
quantos milhões de russos e falantes de russo viviam fora das fronteiras da
Rússia, o que iria acontecer com eles. Portanto, é uma provocação ver os
políticos que então apoiaram Yeltsin para derrubar a URSS, a denunciar
constantemente Lenin pela dissolução da URSS e convocar para uma "luta
antifascista" na Ucrânia.
A abordagem atual da China
Além disso, a questão do
confronto ideológico-político sobre o que é o socialismo é de suma importância.
Existem vários partidos que “chamam carne de peixe”. Há alguns anos, surgiram
várias teorias sobre o “socialismo do século 21” ou “socialismo do bem estar”,
como eram chamados vários governos socialdemocratas da América Latina, que
tentavam administrar o sistema capitalista com slogans promovidos como
“radicais” e medidas de mitigação da miséria extrema do povo. Hoje em dia a
atenção se concentra na China, que diz estar construindo "socialismo com
características chinesas", mas o que está sendo construído lá nada tem a
ver com o socialismo, com os princípios e as leis científicas da construção
socialista. O socialismo consiste na socialização dos meios de produção, do
poder dos trabalhadores, a planificação central. Nada disso existe na China
atual, onde os monopólios chineses determinam os desenvolvimentos, promovem
suas decisões através do Partido Comunista da China, que, entre outras coisas,
levam a enormes desigualdades e injustiças sociais.
Esta questão não tem apenas uma dimensão teórica, mas também uma dimensão diretamente política, e está vinculada à luta pela supremacia no sistema imperialista entre os EUA e a China.
A questão da luta pela supremacia no sistema
imperialista
Esta questão não é simples,
porque está demonstrado na prática que em condições similares, quando a
supremacia do sistema imperialista se viu questionada, ocorreram grandes
confrontos militares, envolvendo dezenas de países, com milhões de mortos pelos
lucros dos capitalistas em conflito.
Hoje, os EUA continuam
sendo a maior potência política, econômica e militar do imperialismo no mundo,
seguidos de perto pela China. Devido à lei do desenvolvimento desigual do
capitalismo vemos que os monopólios chineses estão conquistando posições
importantes no mercado capitalista mundial, na exportação de bens e capitais.
Infelizmente, alguns
partidos comunistas tentam erroneamente usar formas do passado novamente, falando
de uma nova "guerra fria", com a diferença de que na posição da URSS
contra os EUA, eles agora colocam a China. No entanto, a situação atual nada
tem a ver com o confronto entre a URSS e os EUA, pois hoje há um enfrentamento
no terreno do conflito entre os monopólios, ou seja, um confronto intraimperialista.
O KKE no seu posicionamento destacou essa diferença, enquanto outros partidos
como o Partido Comunista do México, o Partido Comunista do Paquistão,
destacaram o caráter capitalista da China atual, enquanto o Partido Comunista
Filipino-1930 falou claramente do hegemonismo expansivo da China contra os
países vizinhos do Pacífico, o qual é usado como pretexto pelos EUA para
intervir na região.
Não se trata, de forma
alguma, um caso de confronto entre capitalismo e socialismo como alguns
partidos como o Partido Comunista do Brasil têm argumentado erroneamente. Não
tem sentido os comunistas tomarem a iniciativa em campanhas políticas como a do
Partido Comunista do Canadá pela libertação da diretora financeira da Huawei,
Meng Wanzhou, filha do presidente do monopólio chinês, cuja fortuna pessoal
ultrapassa 3,4 bilhões de dólares, que foi detida durante algum tempo por causa
do duro conflito entre os monopólios de alta tecnologia. Não é apropriado que
um partido comunista organize uma mobilização para uma empresária, cuja fiança
chegou a 7,5 milhões de dólares, inclusive no mesmo momento que em dezenas de
países ao redor do mundo os comunistas são levados aos tribunais (p.ex.
Ucrânia, Polônia), são presos (p. ex Suazilâdia), estão perseguidos (p. ex. Cazaquistão),
são assassinados a sangue frio (p.ex. Paquistão, Índia) e necessitam da nossa
solidariedade internacionalista.
Cabe dizer, neste momento,
que o KKE enviou deputados, eurodeputados e outros quadros para os julgamentos
de comunistas e partidos perseguidos, na Ucrânia, na Polónia, há alguns anos
nos países bálticos, denunciou assassinatos e perseguições de comunistas em outros
países como Paquistão, Cazaquistão, Sudão, Índia, Venezuela e outros países,
levantando tais questões no Parlamento Europeu.
Sobre a questão da “unidade”
Nas fileiras do Movimento
Comunista Internacional não pode haver uma "unidade" artificial com
forças que questionam e revisam os "fundamentos" do
marxismo-leninismo, como os princípios da revolução e da construção socialista
em nome de "ficar no que por hora nos une”. Tal "unidade", além
da imagem falsa e desorientadora que daria aos comunistas de todo o mundo,
também é perigosa, pois "meia verdade é sempre mentira". Além disso,
esconde as divergências que existem no movimento comunista e dificulta a
discussão para que possam ser superadas. Se os comunistas não têm uma visão
completa do mundo imperialista e se concentram apenas nos EUA-OTAN, ou neoliberalismo,
ou fascismo, separando-os da "matriz" que os gera - ou seja, do
capitalismo e da necessidade de derrubá-lo - eles serão levados para opções trágicas.
O KKE, ciente desta
situação e esclarecendo o povo sobre isso, está atualmente liderando o
movimento anti-imperialista em nosso país contra as bases dos EUA e da OTAN,
contra os chamados "acordos de defesa" da Grécia com os EUA e a
França, contra o envolvimento das forças armadas gregas em missões
além-fronteiras, pela retirada das alianças imperialistas da OTAN e da UE, com
o povo no poder. Levando tudo isso em consideração, o KKE aplica todas as suas
forças contra as políticas antipopulares do governo do ND, SYRIZA e outros
partidos burgueses, bem como a luta contra as formações fascistas criminosas,
buscando criar as condições prévias para a Aliança Social, a derrubada do
capitalismo, para colocar um fim no círculo vicioso da exploração de classe e
das guerras imperialistas.
Sobre o rumo do reagrupamento revolucionário do
movimento comunista internacional
É necessário continuar e
aprofundar ainda mais o debate político-ideológico e esclarecer as questões.
Não temos acordo com a troca de caracterizações entre os partidos, mas queremos
desenvolver uma discussão substancial. Além disso, buscamos realizar ações
conjuntas e convergentes sobre os pontos em que isso é possível e,
particularmente, expressar solidariedade internacionalista.
Apoiamos as formas
existentes de troca de opiniões e cooperação entre os partidos comunistas, como
reuniões internacionais, regionais e temáticas dos partidos comunistas.
Apoiamos as formas mais
avançadas de cooperação do Movimento Comunista Internacional como a
"Iniciativa Comunista Europeia" (ICE) e a "Revisão Comunista
Internacional" (RCI) para a formação de um polo comunista que lutará pelo
reagrupamento revolucionário e a unidade do movimento comunista armado com
nossa visão de mundo, o marxismo-leninismo.
O recente XXI Congresso
do nosso Partido elaborou critérios importantes para a nossa cooperação mais
estreita com os partidos comunistas que: a) defendem o marxismo-leninismo e o
internacionalismo proletário, a necessidade de formar um polo comunista
internacional, b) enfrentam o oportunismo, o reformismo, rejeitam a gestão de
centro-esquerda e qualquer variação da estratégia de etapas, c) defendem as leis
científicas da revolução socialista com as quais avaliam o curso da construção
socialista, procuram investigar e tirar conclusões de problemas e erros, d) têm
uma frente ideológica contra percepções errôneas sobre o imperialismo,
particularmente aquelas que separam sua agressão militar de seu conteúdo
econômico, enfrentam qualquer aliança imperialista, e) desenvolvem laços com a
classe trabalhadora, procuram atuar no movimento sindical, nos movimentos dos
setores populares das camadas médias, buscam integrar a luta cotidiana pelos direitos
operários e populares numa estratégia revolucionária contemporânea pelo poder
operário.
A teleconferência
internacional dos partidos comunistas, as teleconferências da Iniciativa
Comunista Europeia e da Revista Comunista Internacional, também realizadas no
último período, ajudam nosso Partido a estudar melhor a situação do movimento
comunista internacional e de todas as formas de cooperação, destacando, com
base nos critérios anteriormente mencionados, as prioridades e ações conjuntas
com outras partidos.
Edição: Página 1917
Publicado no jornal
“Rizospastis” em 22/01/22.
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