Francisco Martins Rodrigues* (1986)
No artigo anterior, julgamos
ter mostrado que as concepções e a prática do trotskismo acerca do “partido
revolucionário de vanguarda" são inteiramente opostas à teoria leninista
do partido comunista e da Internacional Comunista. Só por si, elas são uma marca
inconfundível do caráter pequeno-burguês do trotskismo, ainda que este se
mascare com oceanos de fraseologia “marxista”.
Francisco Martins Rodrigues |
Tentaremos agora mostrar, na continuação deste comentário ao 12° congresso da IV Internacional, que as posições políticas do trotskismo, com a sua teoria da “revolução permanente”, lhe confirmam por inteiro esse caráter de “marxismo” pequeno-burguês, oposto à revolução proletária e à ditadura do proletariado.
A
Revolução de Vento em Popa
“A contra-ofensiva
imperialista não conseguiu infligir derrotas decisivas à classe operária em
qualquer dos países imperialistas, nem estabilizar a dominação burguesa no essencial
nos países semicoloniais e semi-industrializados, nem conter o movimento de
massas nas regiões onde está em ascenso, nem restaurar o capitalismo em
qualquer dos países onde foi derrubado”. Pelo contrário, deu-se uma “extensão
da revolução socialista na América Central”, uma “vitória decisiva na
Nicarágua”, o “começo da revolução política na Polónia”.
Esta visão otimista com que
abrem as teses sobre a situação internacional apresentadas ao congresso(1)
parece bastante estranha quando aí se reconhece ao mesmo tempo que o movimento
operário sofre uma “crise de direção revolucionária". O mistério desfaz-se,
porém, quando analisamos as tarefas que a Internacional trotskista propõe e
aquilo que considera como vitórias revolucionárias.
Na realidade, a atitude
típica dos trotskistas, correndo de um lado a outro na previsão de vitórias
decisivas da revolução sempre que há uma situação de crise, de instabilidade ou
de simples alternância burguesa, no Irã, na Polónia, na Nicarágua ou nas
eleições francesas, não resulta de ingenuidade, mas de uma linha política que
merece ser observada mais de perto.
O seu “programa combinado
para a revolução proletária nos países imperialistas, para um processo de
revolução permanente nos países dominados e para a revolução política
anti-burocrática nos Estados operários burocratizados”(2) traduz-se em posições
políticas aparentadas com as dos revisionistas soviéticos, nuns casos, e com as
da socialdemocracia, noutros. Exprime uma concepção extremamente oportunista
das tarefas que se colocam ao proletariado em cada uma das grandes frentes da
revolução mundial.
Ao recusar por sistema a
delimitação clara entre os interesses da pequena burguesia e os interesses do
proletariado, toma por “grandes vitórias” as manobras de recomposição burguesa,
colabora no engano das massas e torna-se uma ponta de lança na grande ofensiva
dos tempos modernos contra a revolução proletária – a hegemonia
pequeno-burguesa sobre a classe operária.
"Revolução
Permanente" na Nicarágua
Examinemos o mais recente
modelo da “revolução permanente” com que sonham os trotskistas – a Nicarágua.
Para a Internacional de Mandel é ponto assente que na Nicarágua “o poder passou
para as mãos dos trabalhadores” em Julho de 1979 e aí “triunfou a revolução
socialista”.
Numa longa resolução sobre
“A revolução centro-amerícana”(3), o 12º Congresso vê nos abalos
revolucionários nesse país e no de El Salvador a demonstração de que “há uma
revolução ininterrupta, permanente, que avança das tarefas democráticas e
anti-imperialistas para as tarefas socialistas”. A conquista do poder pela
Frente Sandinista marcou o “estabelecimento da ditadura do proletariado”, os
“primeiros passos da construção de um Estado operário”. Só por “degenerescência
sectária” se pode negar autenticidade proletária à revolução sandinista, tal
como à cubana ou vietnamita.(4)
Esta apreciação (que aliás
esteve na origem de uma cisão na organização de Mandel em 1979) elucida-nos
sobre uma das faces da teoria trotskista da revolução permanente – o famoso
“transcrescimento das tarefas democráticas nacionais em tarefas socialistas”
nos países dependentes.
É certo, admite-se, que “a
construção do partido revolucionário está por fazer”, o que acarreta “riscos”.
Mas esse pormenor não impede que se tenha dado o “transcrescimento”. A prova: a
revolução popular conduziu à “destruição do aparelho de Estado e à instauração
de um poder revolucionário independente da burguesia e do imperialismo”.
Não mostram, contudo, os fatos
que esse “poder revolucionário independente” não passa de um poder instável e
transitório da pequena burguesia, flutuando sobre o movimento operário e
camponês ainda não amadurecido para a independência política, e que, portanto,
é absurdo vir falar em ditadura do proletariado e em revolução socialista!
Para Mandel a dúvida está
fora de questão. Porque a Frente Sandinista (tal como a Frente Farabundo Marti
de El Salvador) são “organizações político-militares que captam a herança
comunista e marxista”. “Têm uma diferença qualitativa das direções
nacionalistas pequeno-burguesas”. “Fazem convergir no cadinho da luta anti-ditatorial
e anti-imperialista níveis e formas diferentes da consciência radical: desde a
corrente marxista e comunista aos defensores da ‘teologia da libertação’,
passando pelas forças democráticas radicais, até ao potencial de revolta das
massas índias e a sua vontade de conquistar a dignidade”.
Deixando de lado a retórica,
o que esta fórmula significa é que os trotskistas não concebem que a pequena
burguesia, entalada entre o imperialismo, a reação interna e o movimento de
massas, possa produzir correntes democrático-revolucionárias; não percebem o
caráter duplo e vacilante dessas correntes e a necessidade de libertar os
operários da sua influência demagógica; pelo contrário, acreditam que elas se
possam transfigurar em direção da revolução proletária. Aqui está como a teoria
trotskista da “revolução permanente” pretende modestamente corrigir Lenine!
Mais ainda, chega-se ao
ponto de afirmar que essas frentes “participam na primeira linha do vasto
processo de reorganização do movimento operário e da sua vanguarda à escala
internacional”. Aí temos os sandinistas investidos na tarefa de reorganizadores
da Internacional!
Esta confusão do
revolucionarismo pequeno-burguês com o revolucionarismo proletário tinha que
levar naturalmente o congresso a desculpar todas as manifestações de
conciliação dos sandinistas face à burguesia e ao imperialismo, pintando-as como
hábeis manobras proletárias.
A convivência com o grande
capital através do sistema de “economia mista” não nos deve alarmar, diz-se,
porque as concessões feitas à burguesia “só podem ser corretamente avaliadas…
no quadro do reforço das posições dos trabalhadores”. A repressão sobre os
comunistas do MAP-ML, acusados de “contra-revolucionários” por se oporem à
conciliação, não merece ser mencionada. As vacilações do regime perante as
chantagens do grupo de Contadora são branqueadas com a alegação de que o
sandinismo “manifestou sempre dúvidas sobre a eficácia” desse grupo. As
pressões capituladoras de Fidel Castro são silenciadas. Declarações mais do que
ambíguas de Tomás Borge são aplaudidas.
Vejam só a habilidade dos
sandinistas quando respondem aos ataques da hierarquia católica com o argumento
de que “há ministros de Deus que são ministros da revolução”. Isto é que é
“combater a hierarquia reacionária no seu próprio terreno”!
O que podemos concluir desta
obstinação pedagógica junto da pequena burguesia? O que significa esta
ingenuidade que tem levado os trotskistas a descobrirem estranhas
potencialidades em movimentos chefiados pela pequena burguesia ou pela
burguesia nacional – na Argélia, na Bolívia, em Cuba, em Portugal, na
Nicarágua?
A conclusão é óbvia: aquilo
que para eles há de aliciante nessas experiências é precisamente a imagem com
que elas se apresentam de um “socialismo” aberto, diferente, pluralista,
intermédio.
A teoria da “revolução
permanente” é o pseudônimo com que os trotskistas mascaram a sua adesão
calorosa à demagogia semi-revolucionária da pequena burguesia, a sua busca de
uma substituição para a ditadura do proletariado, o seu receio ao papel hegemônico
da classe operária.
"Luta
de Morte" ao Capitalismo
O congresso que vimos
analisando não se debruçou em particular sobre a luta operária nos países
capitalistas, mas não deixou de fazer afirmações categóricas de fidelidade ao
leninismo: revolução socialista, ditadura do proletariado, conquista do poder
pela violência, rejeição da “transição pacífica” dos revisionistas.
Vai longe o tempo em que
Mandel profetizava pelas universidades da Europa e da América a chegada de uma
etapa “neocapitalista” e “pós-imperialista” que eliminaria o desemprego e os
conflitos sociais e só deixaria aos marxistas a luta contra a “alienação”…
Será que desta vez os
trotskistas se converteram de fato ao leninismo? De forma nenhuma! Vamos ver
como, por uma série de alçapões, eles se evadem das tarefas da revolução
proletária e a transformam numa caricatura.
Antes de mais, pela sua
estranha noção do que seja o proletariado. A concepção mandelista de
proletariado é tão elástica que engloba nele praticamente todos os setores
assalariados. Declarou o congresso:
“A maior parte dos
empregados dos setores do comércio, da saúde, do crédito e da administração nos
países capitalistas desenvolvidos fazem parte do proletariado”.(5)
Esta noção de um
proletariado “sem fronteiras”, em que se misturam os produtores de mais-valia
com os que ajudam à realização dessa mais-valia pela classe capitalista,
dissolve por completo a perspectiva da revolução proletária. Não por acaso, ela
vem sendo teorizada desde há um quarto de século pelos revisionistas da escola
soviética.
Lenine, no seu tempo, fazia
uma distinção minuciosa na massa dos assalariados, entre proletariado,
semiproletariado, aristocracia operária, pequena burguesia, semipequena-burguesia…
Desde então, o crescimento desmesurado das camadas assalariadas intermediárias
nos países capitalistas e o seu papel de travões da revolução proletária
colocaram aos marxistas a necessidade de fazer uma demarcação rigorosa das
fronteiras do proletariado, uma defesa implacável da sua identidade de classe.
A IV Internacional, contudo,
caminhando em sentido oposto, passa generosos atestados de proletarização a
toda a gente. E pretende mesmo que “aumenta o número de sábios, engenheiros e
técnicos altamente qualificados que passam para o campo do proletariado desde o
início da revolução”.(6)
O que sobeja, nestas
condições, da consigna da “revolução proletária”? Parece evidente que declarar
a pequena burguesia assalariada, a aristocracia operária e o semiproletariado
como parte integrante do proletariado é o meio mais seguro de reduzir a classe
operária à impotência política e de a amarrar à burguesia.
Mas a falsificação vai mais
longe e toma proporções de farsa. Porque se insiste em classificar os partidos socialdemocratas
e revisionistas como “partidos operários”. Dominados por “burocracias
reformistas”, eles seriam de qualquer forma representantes da classe operária!
É assim que o congresso nos informa que em França, Espanha e Grécia o poder
estava em 1985 nas mãos de “partidos operários”.(7) E já em congresso anterior,
reconhecendo a vinculação cada vez maior da socialdemocracia aos monopólios,
alertava-se contudo que “isso não nos deve levar à conclusão de que os partidos
social–democratas se tenham tornado partidos burgueses”… porque continuam a
depender de um eleitorado operário!(8)
Lenine classificava no seu
tempo os partidos reformistas de base operária como “partidos burgueses para
operários” e declarava impossível qualquer luta revolucionária superior sem o
partido comunista arrancar a massa operária à influência desses partidos. Mas
para a Internacional trotskista essa noção está obviamente ultrapassada. Hoje,
que a decomposição política dos partidos reformistas se tornou cem vezes mais
acentuada e a sua influência sobre a massa operária mais profunda, os
trotskistas fazem questão em reconhecê-los como “partidos operários”.
E como lutam contra a sua
influência, já que afirmam querer a revolução? Simplesmente, não lutam. Porque,
na opinião do congresso, “o movimento operário organizado e as suas direções
são incontornáveis nos países imperialistas”.(9)
Resulta daqui que a luta
pela frente única operária se traduz, em versão trotskista, na busca da
cooperação com os “partidos operários” e a palavra de ordem leninista de luta
por um governo operário “toma a forma concreta de governo das organizações
operárias”.(10) Assim, a seção francesa da IV Internacional, a LCR, apressou-se
a apoiar em 1982 o governo de Mitterrand, governo imperialista da burguesia
francesa mas simultaneamente “governo das organizações operárias”…
Naturalmente, a atitude dos
trotskistas perante a questão do poder tem que estar à altura do resto. Não
cedem “nem um milímetro” no princípio da conquista do poder pelas armas, do
derrube violento da burguesia… mas estabelecem como condição universal e
invariável para se chegar até aí a passagem por uma fase de duplo poder. A
situação de dualidade de poderes que se viveu na Rússia em 1917 e que Lenine
classificava como rara e invulgar é por eles erigida em lei absoluta da
revolução.
De modo que nos momentos de
crise revolucionária as atenções dos trotskistas vão todas para a criação de
condições propícias ao “duplo poder”, ou seja, para a descoberta de
alternativas, a valorização de experiências locais de autogestão, a invenção de
“contrapoderes”, etc.
Quando a aproximação duma
prova de força decisiva com a burguesia exige mais do que nunca ao proletariado
espírito de combate, ausência de ilusões, capacidade para atacar de forma
massiva e unificada – a teoria trotskista do “duplo poder” funciona como uma
manobra de diversão suplementar, que ajuda a burguesia a absorver a crise.
Da mobilização independente
do proletariado para a mobilização das franjas pequeno-burguesas radicais; da
luta política de massas para os movimentos estudantis, contestatórios,
ecológicos; da frente única operária para o papel de ponte entre a socialdemocracia
e o revisionismo; da preparação insurrecional das massas para o folclore dos
“contrapoderes” – a teoria trotskista da revolução socialista, despida dos
adornos leninistas, revela-se como uma variante da transição pacífica dos
revisionistas ou da “autogestão” dos socialdemocratas.
Não é de estranhar que o
trotskismo se realize e se esgote no papel de fornecedor de quadros ao
revisionismo e à socialdemocracia. Foi assim que, pouco tempo depois de sair em
defesa do SWP norte-americano (um dos grupos “históricos” da IV Internacional)
contra “ataques caluniosos”(11), Mandel veio lamentar a passagem deste com
armas e bagagens para a linha pró-soviética.
A
"Revolução Política" no Leste
Os trotskistas reivindicam
com orgulho o seu papel de pioneiros na crítica ao falso socialismo da União
Soviética. Mas é forçoso constatar que esse pioneirismo não os levou muito
longe. Nesta frente da luta de classe internacional do proletariado, as
respostas trotskistas são tão ambíguas e reformistas como nas restantes.
Segundo o congresso que
estamos comentando, a União Soviética, China, países da Europa Oriental,
Vietnã, Coreia, Cuba, “permanecem como Estados operários, na medida em que a
produção é organizada na base da propriedade coletiva dos meios de produção, em
que a força de trabalho já não é uma mercadoria no sentido pleno do termo, em
que o monopólio do comércio externo permite ao Estado controlar as influências
do mercado mundial sobre a economia. A burguesia foi expropriada, o capitalismo
abolido, e existem os elementos essenciais de uma economia planificada”.(12)
Resulta daqui a conhecida
tese de que a classe operária desses países é explorada e oprimida por uma “casta
burocrática usurpadora e parasitária” que não é uma nova classe burguesa porque
não detém a propriedade jurídica dos meios de produção.
Deste modo, a regulação
crescente da economia desses países através do mercado, a ação da lei do lucro
como motor da produção, a livre circulação de capitais sob a forma da autonomia
das empresas, a extração de mais-valia ao trabalho assalariado – todos os fatos
que mostram como, sob o invólucro das relações socialistas, se definem os
contornos de um capitalismo de Estado, tudo isto e apagado.
O campo dos países de Leste
constituiria assim uma gigantesca exceção ao marxismo, uma vez que as suas
relações de produção não seriam nem capitalistas nem socialistas, mantendo-se
em perpétuo processo de degeneração. Mais: aí não existiria luta de classes. “A
relação que existe entre os trabalhadores da URSS e a burocracia dominante e
opressora não é uma relação de classe”, certifica um teórico trotskista.(13)
As consequências políticas
desta tese aberrante mostram que ela não é apenas produto de delírio teórico.
Primeiro, as
contra-revoluções burguesas que se consumaram na URSS nos anos 50 e na China
nos anos 70 não teriam existido. Kruchov e Teng Siao-ping representariam apenas
novas gerações de burocratas, semelhantes às que se personificavam em Stalin e
Mao Tsé-tung. A luta contra o revisionismo moderno como nova ideologia burguesa
pura e simplesmente não teria sentido. Tudo o que é preciso é lutar contra o
“stalinismo”.
Segundo, a tarefa que se
coloca aos operários da União Soviética, China, etc., não é a de se preparar
para uma verdadeira revolução socialista, pela reconquista do poder, mas apenas
levar a cabo uma “revolução política antiburocrática”, na via já ensaiada na
Hungria, Checoslováquia e Polônia.(14) Logo, a saída que se coloca aos
operários do Leste é deixarem-se arregimentar pela socialdemocracia ou pela
Igreja em movimentos reformistas.
Terceira consequência, não
menos escabrosa:
“Os Estados operários, mesmo
burocraticamente degenerados ou deformados, devem ser defendidos contra toda a
tentativa de neles restaurar o capitalismo. Reconhecemos a esses Estados o
direito de se dotar do armamento necessário, inclusive armamento nuclear, como
meio de dissuasão face ao imperialismo”.(15)
Ou seja: em vez de se apoiar
a classe operária do Leste contra a ameaça de agressão do imperialismo
norte-americano e contra a sua própria burguesia “comunista”, entrega-se a esta
burguesia o cuidado de impedir (com armas nucleares!) a “restauração do
capitalismo”! Seria difícil encontrar caricatura mais grotesca do marxismo.
Reformismo
de Extrema-Esquerda
Não pretendemos com este
breve artigo fazer uma análise ao pensamento de Trotski nem à história do
trotskismo, nem às múltiplas correntes em que se divide na atualidade. Tentamos
apenas mostrar, através de um documento recente de uma das suas facções, como a
abundante fraseologia leninista recobre sempre a mesma estratégia: apoio a
todas as soluções intermediárias que possam servir de derivativo à revolução
proletária, à ditadura do proletariado.
O mesmo que fazem afinal os socialdemocratas
e os revisionistas. Mas com uma diferença. Estes fazem o trabalho diário, “sério”,
de acorrentamento ideológico e político dos operários. Precisam por isso de se
organizar em partidos centralizados e consistentes, intervir de forma
sistemática no movimento sindical e político da classe operária. A vocação dos
trotskistas, pelo contrário, é manter-se como franjas da pequena-burguesia
rebelde, dispersos em inúmeras seitas agitativas.
E se é certo que isso lhes
tira capacidade para um controle em profundidade do movimento operário,
semelhante ao dos revisionistas e socialdemocratas, dá-lhes em troca maior
mobilidade para emergirem nos períodos de agitação e de crise do sistema como
“vanguarda revolucionária” não-burocratizada, criadora, crítica, etc.,
repescando para o reformismo elementos já desiludidos com os grandes partidos.
As críticas virulentas do
trotskismo às “burocracias reformistas” não correspondem, pois, a qualquer
oposição de princípio. Retratam a concorrência e rivalidade entre facções
diversas da mesma classe pequeno-burguesa, com especializações e estilos
diferentes, mas que a longo prazo se completam. Nos momentos críticos em que o
proletariado se defronta com a tarefa de avançar para a revolução e a conquista
do poder político, a convergência de fundo entre uns e outros aparece à luz do
dia. Pudemos observá-lo entre nós no Verão de 75.*
Notas:
(1) 12° Congresso mundial, Quarta Internacional, n° especial 17-18, Setembro 1985, p. 6.
(2) Id., p. 25.
(3) Id. pp. 92-111.
(4) Id., p. 32.
(5) Id., p. 42.
(6) 10.º Congresso, p. 35.
(7) 12° Congresso, p. 8.
(8) 10.° Congresso, p. 31.
(9) 12.° Congresso, p. 40.
(10) 10.° Congresso, p. 37.
(11) 11.º Congresso, p. 262.
(12) 12.° Congresso, p. 33.
(13) Pierre Fougeyrollas, Les métamorphoses de la crise, Hachette, 1985, p. 215.
(14) 12.° Congresso, p. 18.
(15) Id., p. 20.
*Militante revolucionário de longa data, Francisco Martins Rodrigues (1927-2008) foi membro do CC do Partido Comunista Português e viria a romper com o seu reformismo por altura da polêmica sino-soviética, fundando a FAP e o CMLP, a primeira organização marxista-leninista portuguesa. Foi o primeiro a introduzir em Portugal de uma forma organizada as lições da revolução chinesa e o exemplo de Mao Tsétung. Preso várias vezes e barbaramente torturado pela PIDE, manteve-se ao longo de toda a sua vida do lado da Revolução e empenhado na organização de uma corrente comunista revolucionária. O 25 de Abril de 1974 apanhou o camarada "Chico" na prisão e os militares "democratas" do MFA tentaram mantê-lo preso. Só a forte vontade popular e grandes manifestações à porta da prisão o conseguiram libertar. A partir de 1985 e até morrer em 2008 foi diretor da revista "Política Operária", que também fundou. É em nome da prioridade do papel do operariado que, em 1984, abandona o PCP (R) e a UDP, acusando os outros dirigentes de cedências à pequena burguesia. Escreve então o livro "Anti-Dimitrov. 1935-1985 meio-século de derrotas da Revolução" (1985), onde sistematiza a sua crítica ao dimitrovismo, ao estalinismo e ao maoismo. Funda a "Política Operária", a sua última revista, que manteve praticamente até à morte.
**O autor se refere a Revolução dos Cravos em Portugal.
Fonte: https://www.marxists.org
Edição: Página 1917.
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