Neste texto, nos propomos a comentar os pontos
principais do artigo de Lenin, de outubro de 1916, O Imperialismo e a Cisão do
Socialismo. Em uma conjuntura de amplo predomínio do oportunismo, posição
burguesa no movimento operário, na Europa, Lenin escreve um artigo ao mesmo
tempo teórico (a partir dos estudos que culminaram no seu livro Imperialismo,
Fase Superior do Capitalismo) e militante, analisando a nova etapa,
imperialista, do capitalismo mundial e combatendo sem tréguas o oportunismo. No
seu artigo, Lenin trata do que chamava então de “a questão fundamental do
socialismo contemporâneo”: a saber, “existe uma ligação entre o imperialismo e
a vitória monstruosa e abominável que o oportunismo … alcançou sobre o
movimento operário na Europa?”.
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Lenin discursando no Congresso da Internacional Comunista |
Na conjuntura atual, já faz um longo tempo, também há
uma “vitória monstruosa e abominável” do oportunismo e do reformismo no
movimento operário e também dentre os (auto)denominados marxistas e comunistas,
inclusive a deturpar e mutilar a teoria revolucionária do imperialismo de
Lenin. Isso se relaciona à força muito reduzida da posição revolucionária,
comunista, tanto em termos partidários quanto na sua influência no movimento
operário em todo o mundo. Nos dias de hoje, e também há décadas, o imperialismo
domina inteiramente a economia mundial. O texto de Lenin, portanto, ainda traz
muitas lições para os comunistas contemporâneos e nos serve ainda hoje de base
para realizar a análise concreta da realidade concreta e defender a posição
proletária na luta de classes.
Imperialismo, a fase atual do capitalismo
Contra a errônea visão do oportunismo de Kautsky (que
“define o imperialismo como uma política ‘preferida’ pelo capital financeiro”)
presente hoje em quase toda a “esquerda”, de que o imperialismo constitui
(apenas) uma política externa agressiva e militar dos países dominantes, Lenin,
no capítulo 7 do seu livro, apresenta a “definição o mais breve possível do
imperialismo”: “o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo”. Por ser
uma fase do capitalismo, não poderia deixar de ser “desenvolvimento e
continuação direta das características fundamentais” – ainda que de forma
contraditória, negando-as – desse modo de produção: concorrência entre os
capitais, concentração e centralização de capitais, tendência à queda da taxa
de lucro, luta constante para contra-arrestar essas tendências etc. No referido
capítulo de O Imperialismo, na sequência dessa definição – que ele afirmava
conter o principal, mas achava insuficiente –, Lenin a desdobra nos seus “cinco
traços fundamentais”:
“1) a concentração da produção e do capital levada a
um grau tão elevado de desenvolvimento que criou os monopólios, os quais
desempenham um papel decisivo na vida econômica;
2) a fusão do capital bancário com o capital industrial
e a criação, baseada nesse “capital financeiro” da oligarquia financeira;
3) a exportação de capitais, diferentemente da
exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande;
4) a formação de associações internacionais
monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si, e
5) o termo da partilha territorial do mundo entre as
potências capitalistas mais importantes”.
No artigo de outubro de 1916, poucos meses após terminar
a redação do seu livro, Lenin reafirma a importância fundamental dos monopólios
para a caracterização de uma nova fase histórica do capitalismo: “A
substituição da livre concorrência pelo monopólio é o traço econômico
fundamental, a essência do imperialismo”. E, mais adiante: “O imperialismo é o
capitalismo monopolista. Cada cartel, truste, consórcio, cada banco gigantesco é
um monopólio”.
No mesmo texto, Lenin realiza uma inversão importante
na forma de apresentação dos cinco traços fundamentais do imperialismo,
passando a expressar os demais traços como manifestações do caráter monopolista
do capitalismo:
“O monopolismo manifesta-se em 5 tipos principais:
1) os cartéis, consórcios e trustes; a concentração da
produção alcançou o nível que gerou estas associações monopolistas de
capitalistas;
2) a situação monopolista dos grandes bancos: 3-5
bancos gigantescos comandam toda a vida econômica da América, da França, da
Alemanha;
3) a apropriação das fontes de matérias-primas pelos
trustes e pela oligarquia financeira (o capital financeiro é o capital
industrial monopolista que se fundiu com o capital bancário);
4) a partilha (econômica) do mundo pelos cartéis
internacionais começou. Contam-se já para cima de cem desses cartéis
internacionais, que dominam todo o mercado mundial e o dividem ‘amistosamente’
— enquanto a guerra não o redividir. A exportação do capital, como fenômeno
particularmente característico, diferentemente da exportação de mercadorias no
capitalismo pré-monopolista, está em estreita ligação com a partilha econômica
e político-geográfica do mundo;
5) a partilha territorial do mundo (colônias)
terminou”.
Com essas manifestações do “monopolismo”, Lenin
demonstra os protagonistas da passagem do capitalismo para sua nova fase, imperialista:
os monopólios capitalistas (industriais, bancários, financeiros), gerados pela
concentração e centralização de capitais – tendências inerentes ao capitalismo.
Monopólios que, para usar uma figura de linguagem, se situam “acima” da
concorrência com os demais capitais não monopolistas, subordinando-os, e
extraem superlucros de seu caráter monopolista.
Esses monopólios só acham sua correta medida na
comparação com outros monopólios, tanto no seu país de origem quanto nos demais
e no mercado mundial. Nos dois casos, há a tendência de organizar “associações”
(carteis ou trustes), formais ou informais, para dividir os mercados e garantir
os superlucros monopolistas. Como esse “equilíbrio” é intrinsecamente instável,
a concorrência feroz entre os monopólios se impõe sempre, a cada tentativa de
“redividir” esses mercados e disputar novos.
Esses monopólios capitalistas ultrapassam o espaço de
acumulação de capitais de seu país de origem (sem abandoná-lo, é claro) e se
expandem no mercado mundial via exportação de capitais (e também de
mercadorias), integrando-o e partilhando-o, na busca de garantir acesso
permanente a fontes de matérias-primas e de montar suas cadeias transnacionais
de fornecimento e de produção/exploração. A ação dos monopólios, portanto, é
fundamental para a estruturação do sistema imperialista mundial, cindido entre
países dominantes e dominados, definindo os espaços e os limites (flexíveis) de
acumulação para os seus capitais.
O monopólio reforça sua dominação e seu controle (não
sem contradições) sobre seu próprio estado, assim como sobre os estados dos
países dominados. Reforça também a atuação do estado capitalista para garantir
e ampliar sua acumulação e seu lucros, entre outras formas, pela partilha do
mundo entre os estados imperialistas e seus capitais monopolistas. Cada
contestação dessa partilha, como a atual disputa entre a ascendente China
imperialista e os EUA, cria conflitos e contradições interimperialistas que, no
limite, só se “resolvem” mediante guerras imperialistas.
A seguir, enumeramos aspectos gerais da atuação dos
monopólios capitalistas neste começo do século XXI, tendo como base a teoria
marxista-leninista.
Imperialismo hoje: características gerais
1) Monopólio, centralização de capital e concorrência:
um capital atinge o caráter monopolista apenas após um longo processo de
ampliação de sua escala de acumulação (concentração). Além disso, também
caracteriza o processo de monopolização as inúmeras aquisições de empresas
concorrentes (centralização), pelas quais esse capital vai crescendo mais
aceleradamente, eliminando seus concorrentes e passando a ter uma atuação
praticamente absoluta em determinado ramo da produção (posteriormente
expandindo-se para outros ramos) e local de atuação (regional, depois nacional
e mesmo mundial).
Os monopólios imperialistas neste começo do século XXI
alcançaram tal magnitude que estruturaram sua atuação em escala verdadeiramente
mundial. Isso ocorre, por um lado, pela criação de uma intrincada rede de
subsidiárias ao redor do mundo, pelas quais dividem os mercados nacionais
dentro do próprio grupo monopolista. Por outro, pela estruturação de ampla
cadeia de fornecedores de matérias-primas e de insumos e de produtores “terceirizados”
para suas mercadorias, que são então distribuídas para os diversos mercados.
Dessa forma, a maior parte dos fluxos de mercadorias e de capitais no mercado
mundial são internas ao próprio monopólio imperialista.
Das características dos monopólios contemporâneos, da
sua atual forma de atuação na economia global, decorrem pelo menos três
aspectos importantes para a análise do sistema imperialista mundial:
I) organização e planejamento da acumulação e do lucro
internamente ao monopólio: o fato de as diversas etapas do processo de produção
e de distribuição serem realizadas dentro do próprio monopólio ou sob seu
controle estrito (pela rede de fornecedores e de produtores “terceirizados”),
possibilita ao monopólio um planejamento praticamente integral de todo esse
processo, definindo estratégias para a maximização conjunta da sua taxa de
lucro, composta de parcelas produtivas, financeiras, especulativas, nos
distintos ramos e regiões de sua atuação. Exatamente a dimensão alcançada pelos
monopólios, que possibilitavam esse planejamento, Lenin afirmava representar e
promover uma “socialização da produção”.
II) subordinação dos capitais não monopolistas: ainda
que não elimine completamente a concorrência entre esses dois “tipos” de
capital, a relação entre o capital monopolista e os capitais não monopolistas é
de subordinação. Por um lado, pela capacidade do monopólio de incorporar esses
capitais não monopolistas ao seu próprio processo produtivo, definindo e
impondo as condições para essa atuação. Por outro, pelo caráter “complementar”
desses últimos, em produtos, segmentos ou regiões em que não se fazem presentes
os monopólios, por isso mesmo tendo limitada sua escala de atuação e de
acumulação. O mais frequente é que quando há crescimento dos capitais não
monopolistas acima de determinado “limite”, esses sejam comprados pelos
monopólios, reforçando-os; ou então sofram uma concorrência exacerbada por
parte dos monopólios, usando todas as suas “armas”.
Essas duas características (planejamento e subordinação
dos capitais não monopolistas) concretizam a afirmação de Lenin dos monopólios
existindo “acima e ao lado” da concorrência. A característica a seguir
complementa a frase de Lenin, de que os monopólios não eliminam a concorrência,
mas engendram “contradições, fricções e conflitos particularmente agudos e
intensos”.
III) agravamento das contradições entre os monopólios:
muito embora Lenin mencione as formas de alianças entre monopólios (“cartéis,
consórcios e trustes”), esses acordos são sempre provisórios e instáveis.
Acordos fechados para serem posteriormente repactuados pela mudança das
condições originais e, principalmente, rompidos.
O permanente na relação entre os monopólios, sua
tendência principal, é a concorrência. Essa concorrência, entre empresas com as
magnitudes dos monopólios, ocorre de maneira potencializada, em múltiplas
dimensões, na sua atuação nacional e global, em diversos ramos, incluindo a
relação com fornecedores, utilizando sua força financeira na forma de
rebaixamento “artificial” de preços (dumping), entre muitos outros. Inclusive,
a concorrência entre monopólios de distintos países transforma-se, muitas
vezes, em disputas entre os próprios estados imperialistas.
2) Monopólio e mercado de trabalho: a atuação global
dos monopólios possibilita a criação de uma espécie de “mercado de trabalho
mundial”, com a livre circulação de mercadorias e de capitais reforçando a
tendência para uma maior equalização dos salários e das demais condições de
trabalho. Desnecessário enfatizar que essa tendência de maior equalização se dá
mediante o rebaixamento dos salários e a piora das demais condições de
trabalho.
Isso ocorre tanto no nível do valor, com o mercado
mundial contribuindo para reduzir o tempo de trabalho necessário na medida em que
vão conquistando mercado as mercadorias mais baratas; quanto no nível dos
salários (reduzidos abaixo do seu valor), dada a maior capacidade de ofensiva
dos monopólios na luta de classes contra as classes dominadas. Além disso, e
não menos importante, essa maior “equalização” também se reflete na
regulamentação do mercado de trabalho, com os estados capitalistas promovendo
“reformas trabalhistas” na busca de tornar seus capitais competitivos no novo
padrão mundial de concorrência entre monopólios.
Esse processo competitivo entre os monopólios também
tende a ampliar a população excedente, agravando a piora das condições de vida
da massa dominada. Apenas uma pequena (e decrescente) parcela dos/as
trabalhadores/as, principalmente nos países imperialistas, consegue manter um
mínimo padrão de vida razoável. Nos efeitos políticos e ideológicos dessa
divisão material da classe operária Lenin vai fundamentar as condições de
surgimento e consolidação do oportunismo, como veremos abaixo.
Por outro lado, o caráter mundial do sistema
imperialista e, consequentemente, do mercado de trabalho, torna também mais
necessário que nunca o internacionalismo proletário, a solidariedade e a união
dos/as proletários/as de todos os países, em sua luta comum, sem fronteiras nem
pátria, contra o imperialismo.
3) Monopólio e economia mundial: embora já tenhamos
comentado nos itens anteriores a relação entre os monopólios e a econômica
mundial, é importante destacar, neste item, os seguintes aspectos.
I) atuação global dos monopólios conforma e
reconfigura a economia mundial: como afirma Lenin, além da exportação de bens e
serviços (mercadorias), há no imperialismo a exportação de capitais e esta tem
uma grande influência na economia mundial: “A exportação do capital, como
fenômeno particularmente característico, diferentemente da exportação de
mercadorias no capitalismo pré-monopolista, está em estreita ligação com a
partilha econômica e político-geográfica do mundo”.
A exportação de capital compreende tanto os
investimentos produtivos para criação da rede de subsidiárias no exterior dos
monopólios transnacionais; quanto as dívidas externas, pelas quais se amarra o
devedor às obrigações com o credor; e ainda os capitais especulativos, cuja
ameaça permanente de uma repentina “fuga” exerce a pressão “disciplinadora” do
capital mundial, mediante a constante chantagem.
A geografia da atuação dos monopólios transnacionais
no sistema imperialista é dada a partir dessa rede de exportação de capital
que, como já dito, “está em estreita ligação com a partilha econômica e
político-geográfica do mundo”. Mais que isso, essa partilha também implica
forte tendência de definição dos espaços disponíveis para acumulação nas
diferentes formações sociais, especialmente as dominadas. Esse fenômeno, também
chamado de “parqueamento” faz parte da maneira com que os monopólios conformam
a economia mundial. Dada a concorrência entre os capitais, seus impactos
políticos e as crises econômicas, essa conformação do sistema imperialista está
em constante pressão por uma redivisão, reconfiguração, sempre mediante
conflitos interimperialistas em distintos graus.
II) há uma relação direta entre a partilha do mundo
entre os monopólios e entre as potências imperialistas: inicialmente, a
exportação de capitais dos monopólios tinha como destino prioritário os países
dominados pelo seu país imperialista. Atualmente, essa relação é muito mais
complexa e pode atuar para os dois lados. Tanto as relações de dominação
político-econômica entre países abrem espaços para a expansão internacional dos
monopólios, quanto esta pode abrir espaço para aquelas.
Os esforços dos monopólios transnacionais e dos seus
países imperialistas para ampliar sua atuação no sistema imperialista mundial
se reforçam mutuamente e, nesse processo, entram em conflito necessário com a
atuação dos demais. Como afirmava Lenin: “os capitalistas não só têm por que
combater como não podem deixar de combater se quiserem conservar o capitalismo,
porque sem redistribuição violenta das colônias os novos países imperialistas
não podem adquirir os privilégios de que gozam as potências imperialistas mais
velhas (e menos fortes)”. Devemos ampliar o texto de Lenin, na conjuntura
atual, de “colônias” para toda uma série de relações de dominação e influência
econômica e política.
III) sistema imperialista da economia mundial como um
todo contraditório, marcado pelos conflitos interimperialistas e pela divisão
entre países dominantes e dominados: com essas observações sumárias já podemos
ter uma melhor visão da fase imperialista do capitalismo como estruturando um
sistema (imperialista) na economia mundial. Portanto, quando falamos de
imperialismo, estamos falando fundamentalmente da economia capitalista mundial.
Economia capitalista mundial, ou sistema imperialista,
que mantém e agrava as contradições do capitalismo – várias delas já abordadas
acima, outras na sequência – e que, para o ponto em análise, importa enfatizar
que se divide entre países dominantes e países dominados. Em função das
próprias contradições desse sistema, Lenin as vê tendencialmente evoluindo para
conflitos com intensidade cada vez maior: “O monopólio do capital financeiro
moderno é furiosamente contestado; começou a época das guerras imperialistas”.
Ou seja, absolutamente nada das piedosas, reacionárias e oportunistas
formulações de Kautsky sobre “superimperialismo” – uma hipotética aliança
duradoura entre os capitais para uma exploração comum de todo o mundo – e paz
permanente sob o capitalismo.
4) Monopólio e taxa de lucro: já vimos que o objetivo
de cada monopólio, considerado individualmente, como uma parcela do capital em
geral, é obter superlucros monopolistas, ou seja, “um excesso de lucros acima
dos lucros capitalistas normais e habituais” em função de sua posição
monopolista no mercado. Em suma, ampliar sua taxa de lucro – objetivo de
qualquer capitalista.
Esse superlucro monopolista, no entanto, tende a ser
temporário, enquanto não se generalizem suas condições de produção, o acesso ao
mercado etc. Além disso, e não obstante o caráter planejado do monopólio, a
tendência de crescimento de sua escala de produção/acumulação, o crescimento de
sua produtividade e da composição orgânica do seu capital, a concorrência entre
os monopólios, todos esses fatores contribuem para uma tendência de
superprodução de mercadorias e de superacumulação de capitais, o que significa
que os monopólios, o imperialismo, não revogam a tendência de queda da taxa de
lucro. Pelo contrário, com base nas crises do final do século passado e deste,
podemos mesmo trabalhar a hipótese de que os monopólios tendem a agravar a
tendência de queda da taxa de lucro no sistema imperialista mundial.
5) Monopólio e crises do capital: o sistema
imperialista mundial, portanto, não só não elimina ou minimiza a tendência de
crises periódicas, inerente ao capitalismo, como podemos mesmo afirmar que as
reforça. Aumento da composição orgânica do capital, superprodução e
superacumulação, queda da taxa de lucro, todas essas tendências do capitalismo
parecem agravadas no imperialismo. As crises têm, no imperialismo, reforçado o
seu caráter mundial e agravadas suas intensidade e frequência.
Adicionalmente, o movimento do próprio capital em
direção a uma acumulação diretamente financeira, especulativa, tem no monopólio
imperialista o seu ator por excelência, devido à magnitude do capital que
transita pelos circuitos internos de cada monopólio. O capital financeiro, no
conceito leninista de um mesmo grupo monopolista atuando em ramos industriais e
bancários, é o agente principal desses fluxos de capitais
financeiros-especulativos. A circulação puramente fictícia desses capitais e o
rentismo dos seus proprietários caracterizam o que Lenin chamava de
“capitalismo parasitário ou em decomposição”, que também integra a definição
leninista de imperialismo.
A exacerbada ampliação de capital fictício no
capitalismo do final do século XX e início do século XXI é uma característica
integrante do sistema imperialista atual, com a interrupção de sua acumulação e
a repentina destruição desse capital sendo, no mais das vezes, o momento que
marca o início da crise do capital e uma característica do agravamento dessa
própria crise.
6) Burguesia monopolista e as demais frações do
capital: a constituição dos monopólios capitalistas nas principais potências
imperialistas marcou a passagem do capitalismo para sua nova etapa, o
imperialismo, na virada dos séculos XIX e XX. Nestas primeiras décadas do
século XXI, a tendência à monopolização já atingiu efetivamente praticamente
todos os países do mundo e todos os principais ramos da produção, tanto em
nível nacional quanto mundial. Dessa forma, a existência dos monopólios
dominando as economias nacionais não é mais característica apenas dos países
imperialistas. Nos países dominados, vemos a existência e a atuação conjunta
dos monopólios transnacionais dos países imperialistas e dos monopólios da
burguesia do próprio país dominado (além de alguns monopólios estatais).
Portanto a existência de monopólios nos países
dominados não pode ser desconsiderada ao se realizar a análise das classes
dominantes e de suas frações nesses países. Por um lado, já vimos a
subordinação do capital não monopolista aos monopólios. Dessa forma, segmentar
as frações burguesas apenas por ramos de atividade, desconsiderando os capitais
monopolistas, nos parece um erro. Por outro, os monopólios frequentemente
abarcam diferentes ramos de atividade, de forma que a associação dos seus
interesses a um único ramo também nos parece um equívoco. Ainda, os capitais
monopolistas podem ter interesses comuns entre si, que não estão presentes nas
tradicionais análises de frações de classe. Por fim, isso também pode ser
verdade entre os monopólios transnacionais e os monopólios da burguesia local
atuando em um mesmo país, por sobre ou ao lado das suas contradições.
Dessa forma, um possível caminho para uma análise
teórica mais robusta das classes dominantes e de suas frações hoje, também nos
países dominados, seria analisar concretamente, em cada formação social
concreta, a hipótese de as frações monopolistas constituírem o núcleo central
das classes dominantes. Essa hipótese permitiria avaliar, em conjunto, o grande
capital monopolista atuando no país; sua dominação interna e expansão
internacional; sua complementariedade/contradições com os monopólios
transnacionais; como subordina/concorre com os capitais não monopolistas; se
esse capital monopolista possui um programa próprio e qual seria; como seus
interesses se traduzem em discursos e partidos políticos e políticas de estado
e quais os programas, discursos, partidos e políticas concorrentes/contrárias;
etc.
Combater o Oportunismo como parte integrante do
combate ao Imperialismo
Como vimos, Lenin buscava explicar “a vitória
monstruosa e abominável … [do] oportunismo … sobre o movimento operário na
Europa” no começo do século XX e sua ligação com o imperialismo. Passadas as
duas primeiras décadas do século XXI, nosso papel é constatar o amplo domínio
de posições oportunistas e reformistas na classe operária e nas demais classes
dominadas, assim como em seus movimentos e suas lutas na absoluta maioria dos
países (e não apenas nos europeus). Completa esse quadro a pequena expressão de
massas da posição revolucionária do proletariado em caráter mundial e em cada
país.
Lenin buscava, em seu texto de 1916, as razões
objetivas, materiais, para tal vitória do oportunismo e as encontrou no fato de
que a “burguesia de uma ‘grande’ potência imperialista pode economicamente
subornar as camadas superiores dos ‘seus’ operários”, ao mesmo tempo em que
“oprimem, subjugam, arruínam, a massa do proletariado e do semiproletariado”.
Lenin concluiu que, naquela época, “economicamente já amadureceu e se realizou
a passagem da camada da aristocracia operária para a burguesia”. Politicamente,
essa consolidação das bases do oportunismo se traduz no fato de que “agora o
‘partido operário burguês’ é inevitável e típico de todos os países
imperialistas”. E atualmente não apenas nesses países, como o comprova
exemplarmente o caso brasileiro contemporâneo, com o PT, o PCdoB, entre outros.
Essa é a divisão, a cisão do socialismo de que fala o
artigo de Lenin: a “corrente revolucionária de massas contra a corrente
oportunista pequeno-burguesa”.
E em um país dominado como o Brasil, nos anos 2000,
quais as razões para o predomínio do oportunismo e do reformismo no movimento
operário e de massas? Em parte, podemos partir da mesma explicação. A diferença
das condições de salários, participação nos lucros, “direitos” trabalhistas e
demais condições de vida de uma parcela pequena da classe operária, a defesa
dessas diferenciações, o temor de perdê-las como fatores objetivos para a
adoção de posições de conciliação de classes.
No entanto, isso não é tudo. É preciso considerar ao
menos três fatores adicionais para explicar o oportunismo e o reformismo e
definir a atuação dos comunistas no combate sem tréguas contra ele:
1) o oportunismo das direções sindicais: a captura dos
aparelhos sindicais e de suas direções (que buscam perpetuar-se nessa condição
separada dos demais operários) pela burguesia, para que passem a defender
posições oportunistas, posições burguesas no meio operário, moderando e
institucionalizando a luta de classes do proletariado, é fato mais do que
conhecido, inclusive pela prática quotidiana da militância de cada camarada,
com inúmeros exemplos.
A esse respeito, Lenin cita as palavras de Marx,
explicitamente denunciando que “os dirigentes-operários ingleses venderam-se”.
Em outro trecho: “é de lamentar que todo o bando dos chefes não tenha entrado
para o Parlamento. Seria o caminho mais seguro para nos vermos livres dessa
canalha”. Aqui no Brasil, o cretinismo parlamentar foi o caminho “natural” de
vários deles…
2) as condições subjetivas a partir da ideologia
dominante: nas condições atuais de domínio absoluto do capitalismo e de derrota
do socialismo, a ideia revolucionária está muito distante das massas. A
ideologia dominante, nas suas mais variadas formas, prega a inevitabilidade
desse estado de coisas (a exploração capitalista); a ideia de não contar com as
próprias forças, mas de canalizar as reivindicações nas instâncias
institucionais do Estado capitalista (executivo, parlamento, judiciário); a
ideia de luta como limitada a reivindicações sindicais e institucionais; etc.
3) ausência do partido comunista com presença nas
massas operárias: fator adicional para a hegemonia do oportunismo e do
reformismo é a ausência da posição revolucionária organizada, do partido
comunista, com forte participação na luta de classes ao lado dos dominados.
Por esse conjunto de fatores, temos esse prolongado
período de predomínio absoluto do oportunismo e do reformismo e de sua
subserviência aos patrões.
Cabe, portanto, aos comunistas e ao proletariado nos
dias de hoje reforçar essa “cisão do socialismo”, demarcar o campo com o
oportunismo e o reformismo, diferenciando-nos explicitamente deles, sendo o seu
contrário. A pergunta que deve nos guiar nessa ação é a mesma já feita por
Lenin: “o principal — … significado real, objetivo, da sua política: esta política
representa as massas, serve as massas, isto é, a libertação das massas do
capitalismo, ou representa os interesses de uma minoria, a sua conciliação com
o capitalismo?”.
Para isso, é imprescindível não se afastar, não se
diferenciar, dos/as operários/as e das massas. Pelo contrário, toda a linha de
massas dos comunistas implica a necessidade de trabalhar e lutar lado a lado,
ombro a ombro, com a classe operária e com as massas exploradas,
independentemente de as mesmas estarem sujeitas a direções e a linhas
oportunistas e mesmo quando elas estejam vinculadas a sindicatos e a movimentos
reformistas.
Vamos concluir essa nossa análise com as conclamações
de Lenin em 1916:
“O fato é que os ‘partidos operários burgueses’, como
fenômeno político, se formaram já em todos os países capitalistas avançados,
que sem uma luta decidida e implacável em toda a linha contra estes partidos —
ou grupos, correntes, etc., tanto faz — nem sequer se pode falar de luta contra
o imperialismo ou de marxismo ou de movimento operário socialista”.
“o nosso dever, se queremos permanecer socialistas, é
ir mais baixo e mais fundo, para as verdadeiras massas: nisto consiste toda a
importância da luta contra o oportunismo e todo o conteúdo desta luta.
Desmascarando que os oportunistas … traem e vendem de fato os interesses da
massa, … que eles propagam as ideias e a influência burguesa, que eles são de
fato aliados e agentes da burguesia — ensinamos deste modo as massas a
identificar os seus reais interesses políticos, a lutar pelo socialismo e pela
revolução …”.
“Explicar às massas a inevitabilidade e a necessidade
da cisão com o oportunismo, educá-las para uma luta revolucionária implacável
contra ele … — tal é a única linha marxista no movimento operário do mundo”.
Fonte: https://cemflores.org/
Edição: Página 1917
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