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sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Combater o Imperialismo e o Oportunismo: Tarefas Indispensáveis dos Comunistas*

   Neste texto, nos propomos a comentar os pontos principais do artigo de Lenin, de outubro de 1916, O Imperialismo e a Cisão do Socialismo. Em uma conjuntura de amplo predomínio do oportunismo, posição burguesa no movimento operário, na Europa, Lenin escreve um artigo ao mesmo tempo teórico (a partir dos estudos que culminaram no seu livro Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo) e militante, analisando a nova etapa, imperialista, do capitalismo mundial e combatendo sem tréguas o oportunismo. No seu artigo, Lenin trata do que chamava então de “a questão fundamental do socialismo contemporâneo”: a saber, “existe uma ligação entre o imperialismo e a vitória monstruosa e abominável que o oportunismo … alcançou sobre o movimento operário na Europa?”.

Lenin discursando no Congresso da Internacional Comunista

   Na conjuntura atual, já faz um longo tempo, também há uma “vitória monstruosa e abominável” do oportunismo e do reformismo no movimento operário e também dentre os (auto)denominados marxistas e comunistas, inclusive a deturpar e mutilar a teoria revolucionária do imperialismo de Lenin. Isso se relaciona à força muito reduzida da posição revolucionária, comunista, tanto em termos partidários quanto na sua influência no movimento operário em todo o mundo. Nos dias de hoje, e também há décadas, o imperialismo domina inteiramente a economia mundial. O texto de Lenin, portanto, ainda traz muitas lições para os comunistas contemporâneos e nos serve ainda hoje de base para realizar a análise concreta da realidade concreta e defender a posição proletária na luta de classes.

 Imperialismo, a fase atual do capitalismo

   Contra a errônea visão do oportunismo de Kautsky (que “define o imperialismo como uma política ‘preferida’ pelo capital financeiro”) presente hoje em quase toda a “esquerda”, de que o imperialismo constitui (apenas) uma política externa agressiva e militar dos países dominantes, Lenin, no capítulo 7 do seu livro, apresenta a “definição o mais breve possível do imperialismo”: “o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo”. Por ser uma fase do capitalismo, não poderia deixar de ser “desenvolvimento e continuação direta das características fundamentais” – ainda que de forma contraditória, negando-as – desse modo de produção: concorrência entre os capitais, concentração e centralização de capitais, tendência à queda da taxa de lucro, luta constante para contra-arrestar essas tendências etc. No referido capítulo de O Imperialismo, na sequência dessa definição – que ele afirmava conter o principal, mas achava insuficiente –, Lenin a desdobra nos seus “cinco traços fundamentais”:

“1) a concentração da produção e do capital levada a um grau tão elevado de desenvolvimento que criou os monopólios, os quais desempenham um papel decisivo na vida econômica;

 2) a fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação, baseada nesse “capital financeiro” da oligarquia financeira;

 3) a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande;

 4) a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si, e

 5) o termo da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes”.

   No artigo de outubro de 1916, poucos meses após terminar a redação do seu livro, Lenin reafirma a importância fundamental dos monopólios para a caracterização de uma nova fase histórica do capitalismo: “A substituição da livre concorrência pelo monopólio é o traço econômico fundamental, a essência do imperialismo”. E, mais adiante: “O imperialismo é o capitalismo monopolista. Cada cartel, truste, consórcio, cada banco gigantesco é um monopólio”.

   No mesmo texto, Lenin realiza uma inversão importante na forma de apresentação dos cinco traços fundamentais do imperialismo, passando a expressar os demais traços como manifestações do caráter monopolista do capitalismo:

 “O monopolismo manifesta-se em 5 tipos principais:

1) os cartéis, consórcios e trustes; a concentração da produção alcançou o nível que gerou estas associações monopolistas de capitalistas;

 2) a situação monopolista dos grandes bancos: 3-5 bancos gigantescos comandam toda a vida econômica da América, da França, da Alemanha;

 3) a apropriação das fontes de matérias-primas pelos trustes e pela oligarquia financeira (o capital financeiro é o capital industrial monopolista que se fundiu com o capital bancário);

 4) a partilha (econômica) do mundo pelos cartéis internacionais começou. Contam-se já para cima de cem desses cartéis internacionais, que dominam todo o mercado mundial e o dividem ‘amistosamente’ — enquanto a guerra não o redividir. A exportação do capital, como fenômeno particularmente característico, diferentemente da exportação de mercadorias no capitalismo pré-monopolista, está em estreita ligação com a partilha econômica e político-geográfica do mundo;

 5) a partilha territorial do mundo (colônias) terminou”.

   Com essas manifestações do “monopolismo”, Lenin demonstra os protagonistas da passagem do capitalismo para sua nova fase, imperialista: os monopólios capitalistas (industriais, bancários, financeiros), gerados pela concentração e centralização de capitais – tendências inerentes ao capitalismo. Monopólios que, para usar uma figura de linguagem, se situam “acima” da concorrência com os demais capitais não monopolistas, subordinando-os, e extraem superlucros de seu caráter monopolista.

   Esses monopólios só acham sua correta medida na comparação com outros monopólios, tanto no seu país de origem quanto nos demais e no mercado mundial. Nos dois casos, há a tendência de organizar “associações” (carteis ou trustes), formais ou informais, para dividir os mercados e garantir os superlucros monopolistas. Como esse “equilíbrio” é intrinsecamente instável, a concorrência feroz entre os monopólios se impõe sempre, a cada tentativa de “redividir” esses mercados e disputar novos.

   Esses monopólios capitalistas ultrapassam o espaço de acumulação de capitais de seu país de origem (sem abandoná-lo, é claro) e se expandem no mercado mundial via exportação de capitais (e também de mercadorias), integrando-o e partilhando-o, na busca de garantir acesso permanente a fontes de matérias-primas e de montar suas cadeias transnacionais de fornecimento e de produção/exploração. A ação dos monopólios, portanto, é fundamental para a estruturação do sistema imperialista mundial, cindido entre países dominantes e dominados, definindo os espaços e os limites (flexíveis) de acumulação para os seus capitais.

   O monopólio reforça sua dominação e seu controle (não sem contradições) sobre seu próprio estado, assim como sobre os estados dos países dominados. Reforça também a atuação do estado capitalista para garantir e ampliar sua acumulação e seu lucros, entre outras formas, pela partilha do mundo entre os estados imperialistas e seus capitais monopolistas. Cada contestação dessa partilha, como a atual disputa entre a ascendente China imperialista e os EUA, cria conflitos e contradições interimperialistas que, no limite, só se “resolvem” mediante guerras imperialistas.

 A seguir, enumeramos aspectos gerais da atuação dos monopólios capitalistas neste começo do século XXI, tendo como base a teoria marxista-leninista.

Imperialismo hoje: características gerais

1) Monopólio, centralização de capital e concorrência: um capital atinge o caráter monopolista apenas após um longo processo de ampliação de sua escala de acumulação (concentração). Além disso, também caracteriza o processo de monopolização as inúmeras aquisições de empresas concorrentes (centralização), pelas quais esse capital vai crescendo mais aceleradamente, eliminando seus concorrentes e passando a ter uma atuação praticamente absoluta em determinado ramo da produção (posteriormente expandindo-se para outros ramos) e local de atuação (regional, depois nacional e mesmo mundial).

   Os monopólios imperialistas neste começo do século XXI alcançaram tal magnitude que estruturaram sua atuação em escala verdadeiramente mundial. Isso ocorre, por um lado, pela criação de uma intrincada rede de subsidiárias ao redor do mundo, pelas quais dividem os mercados nacionais dentro do próprio grupo monopolista. Por outro, pela estruturação de ampla cadeia de fornecedores de matérias-primas e de insumos e de produtores “terceirizados” para suas mercadorias, que são então distribuídas para os diversos mercados. Dessa forma, a maior parte dos fluxos de mercadorias e de capitais no mercado mundial são internas ao próprio monopólio imperialista.

   Das características dos monopólios contemporâneos, da sua atual forma de atuação na economia global, decorrem pelo menos três aspectos importantes para a análise do sistema imperialista mundial:

I) organização e planejamento da acumulação e do lucro internamente ao monopólio: o fato de as diversas etapas do processo de produção e de distribuição serem realizadas dentro do próprio monopólio ou sob seu controle estrito (pela rede de fornecedores e de produtores “terceirizados”), possibilita ao monopólio um planejamento praticamente integral de todo esse processo, definindo estratégias para a maximização conjunta da sua taxa de lucro, composta de parcelas produtivas, financeiras, especulativas, nos distintos ramos e regiões de sua atuação. Exatamente a dimensão alcançada pelos monopólios, que possibilitavam esse planejamento, Lenin afirmava representar e promover uma “socialização da produção”.

II) subordinação dos capitais não monopolistas: ainda que não elimine completamente a concorrência entre esses dois “tipos” de capital, a relação entre o capital monopolista e os capitais não monopolistas é de subordinação. Por um lado, pela capacidade do monopólio de incorporar esses capitais não monopolistas ao seu próprio processo produtivo, definindo e impondo as condições para essa atuação. Por outro, pelo caráter “complementar” desses últimos, em produtos, segmentos ou regiões em que não se fazem presentes os monopólios, por isso mesmo tendo limitada sua escala de atuação e de acumulação. O mais frequente é que quando há crescimento dos capitais não monopolistas acima de determinado “limite”, esses sejam comprados pelos monopólios, reforçando-os; ou então sofram uma concorrência exacerbada por parte dos monopólios, usando todas as suas “armas”.

   Essas duas características (planejamento e subordinação dos capitais não monopolistas) concretizam a afirmação de Lenin dos monopólios existindo “acima e ao lado” da concorrência. A característica a seguir complementa a frase de Lenin, de que os monopólios não eliminam a concorrência, mas engendram “contradições, fricções e conflitos particularmente agudos e intensos”.  

III) agravamento das contradições entre os monopólios: muito embora Lenin mencione as formas de alianças entre monopólios (“cartéis, consórcios e trustes”), esses acordos são sempre provisórios e instáveis. Acordos fechados para serem posteriormente repactuados pela mudança das condições originais e, principalmente, rompidos.

   O permanente na relação entre os monopólios, sua tendência principal, é a concorrência. Essa concorrência, entre empresas com as magnitudes dos monopólios, ocorre de maneira potencializada, em múltiplas dimensões, na sua atuação nacional e global, em diversos ramos, incluindo a relação com fornecedores, utilizando sua força financeira na forma de rebaixamento “artificial” de preços (dumping), entre muitos outros. Inclusive, a concorrência entre monopólios de distintos países transforma-se, muitas vezes, em disputas entre os próprios estados imperialistas.

2) Monopólio e mercado de trabalho: a atuação global dos monopólios possibilita a criação de uma espécie de “mercado de trabalho mundial”, com a livre circulação de mercadorias e de capitais reforçando a tendência para uma maior equalização dos salários e das demais condições de trabalho. Desnecessário enfatizar que essa tendência de maior equalização se dá mediante o rebaixamento dos salários e a piora das demais condições de trabalho.

   Isso ocorre tanto no nível do valor, com o mercado mundial contribuindo para reduzir o tempo de trabalho necessário na medida em que vão conquistando mercado as mercadorias mais baratas; quanto no nível dos salários (reduzidos abaixo do seu valor), dada a maior capacidade de ofensiva dos monopólios na luta de classes contra as classes dominadas. Além disso, e não menos importante, essa maior “equalização” também se reflete na regulamentação do mercado de trabalho, com os estados capitalistas promovendo “reformas trabalhistas” na busca de tornar seus capitais competitivos no novo padrão mundial de concorrência entre monopólios.

 Esse processo competitivo entre os monopólios também tende a ampliar a população excedente, agravando a piora das condições de vida da massa dominada. Apenas uma pequena (e decrescente) parcela dos/as trabalhadores/as, principalmente nos países imperialistas, consegue manter um mínimo padrão de vida razoável. Nos efeitos políticos e ideológicos dessa divisão material da classe operária Lenin vai fundamentar as condições de surgimento e consolidação do oportunismo, como veremos abaixo.

   Por outro lado, o caráter mundial do sistema imperialista e, consequentemente, do mercado de trabalho, torna também mais necessário que nunca o internacionalismo proletário, a solidariedade e a união dos/as proletários/as de todos os países, em sua luta comum, sem fronteiras nem pátria, contra o imperialismo.

3) Monopólio e economia mundial: embora já tenhamos comentado nos itens anteriores a relação entre os monopólios e a econômica mundial, é importante destacar, neste item, os seguintes aspectos.

I) atuação global dos monopólios conforma e reconfigura a economia mundial: como afirma Lenin, além da exportação de bens e serviços (mercadorias), há no imperialismo a exportação de capitais e esta tem uma grande influência na economia mundial: “A exportação do capital, como fenômeno particularmente característico, diferentemente da exportação de mercadorias no capitalismo pré-monopolista, está em estreita ligação com a partilha econômica e político-geográfica do mundo”.

 A exportação de capital compreende tanto os investimentos produtivos para criação da rede de subsidiárias no exterior dos monopólios transnacionais; quanto as dívidas externas, pelas quais se amarra o devedor às obrigações com o credor; e ainda os capitais especulativos, cuja ameaça permanente de uma repentina “fuga” exerce a pressão “disciplinadora” do capital mundial, mediante a constante chantagem.

   A geografia da atuação dos monopólios transnacionais no sistema imperialista é dada a partir dessa rede de exportação de capital que, como já dito, “está em estreita ligação com a partilha econômica e político-geográfica do mundo”. Mais que isso, essa partilha também implica forte tendência de definição dos espaços disponíveis para acumulação nas diferentes formações sociais, especialmente as dominadas. Esse fenômeno, também chamado de “parqueamento” faz parte da maneira com que os monopólios conformam a economia mundial. Dada a concorrência entre os capitais, seus impactos políticos e as crises econômicas, essa conformação do sistema imperialista está em constante pressão por uma redivisão, reconfiguração, sempre mediante conflitos interimperialistas em distintos graus.

II) há uma relação direta entre a partilha do mundo entre os monopólios e entre as potências imperialistas: inicialmente, a exportação de capitais dos monopólios tinha como destino prioritário os países dominados pelo seu país imperialista. Atualmente, essa relação é muito mais complexa e pode atuar para os dois lados. Tanto as relações de dominação político-econômica entre países abrem espaços para a expansão internacional dos monopólios, quanto esta pode abrir espaço para aquelas.

   Os esforços dos monopólios transnacionais e dos seus países imperialistas para ampliar sua atuação no sistema imperialista mundial se reforçam mutuamente e, nesse processo, entram em conflito necessário com a atuação dos demais. Como afirmava Lenin: “os capitalistas não só têm por que combater como não podem deixar de combater se quiserem conservar o capitalismo, porque sem redistribuição violenta das colônias os novos países imperialistas não podem adquirir os privilégios de que gozam as potências imperialistas mais velhas (e menos fortes)”. Devemos ampliar o texto de Lenin, na conjuntura atual, de “colônias” para toda uma série de relações de dominação e influência econômica e política.

 III) sistema imperialista da economia mundial como um todo contraditório, marcado pelos conflitos interimperialistas e pela divisão entre países dominantes e dominados: com essas observações sumárias já podemos ter uma melhor visão da fase imperialista do capitalismo como estruturando um sistema (imperialista) na economia mundial. Portanto, quando falamos de imperialismo, estamos falando fundamentalmente da economia capitalista mundial.

   Economia capitalista mundial, ou sistema imperialista, que mantém e agrava as contradições do capitalismo – várias delas já abordadas acima, outras na sequência – e que, para o ponto em análise, importa enfatizar que se divide entre países dominantes e países dominados. Em função das próprias contradições desse sistema, Lenin as vê tendencialmente evoluindo para conflitos com intensidade cada vez maior: “O monopólio do capital financeiro moderno é furiosamente contestado; começou a época das guerras imperialistas”. Ou seja, absolutamente nada das piedosas, reacionárias e oportunistas formulações de Kautsky sobre “superimperialismo” – uma hipotética aliança duradoura entre os capitais para uma exploração comum de todo o mundo – e paz permanente sob o capitalismo.

4) Monopólio e taxa de lucro: já vimos que o objetivo de cada monopólio, considerado individualmente, como uma parcela do capital em geral, é obter superlucros monopolistas, ou seja, “um excesso de lucros acima dos lucros capitalistas normais e habituais” em função de sua posição monopolista no mercado. Em suma, ampliar sua taxa de lucro – objetivo de qualquer capitalista.

   Esse superlucro monopolista, no entanto, tende a ser temporário, enquanto não se generalizem suas condições de produção, o acesso ao mercado etc. Além disso, e não obstante o caráter planejado do monopólio, a tendência de crescimento de sua escala de produção/acumulação, o crescimento de sua produtividade e da composição orgânica do seu capital, a concorrência entre os monopólios, todos esses fatores contribuem para uma tendência de superprodução de mercadorias e de superacumulação de capitais, o que significa que os monopólios, o imperialismo, não revogam a tendência de queda da taxa de lucro. Pelo contrário, com base nas crises do final do século passado e deste, podemos mesmo trabalhar a hipótese de que os monopólios tendem a agravar a tendência de queda da taxa de lucro no sistema imperialista mundial.

5) Monopólio e crises do capital: o sistema imperialista mundial, portanto, não só não elimina ou minimiza a tendência de crises periódicas, inerente ao capitalismo, como podemos mesmo afirmar que as reforça. Aumento da composição orgânica do capital, superprodução e superacumulação, queda da taxa de lucro, todas essas tendências do capitalismo parecem agravadas no imperialismo. As crises têm, no imperialismo, reforçado o seu caráter mundial e agravadas suas intensidade e frequência.

  Adicionalmente, o movimento do próprio capital em direção a uma acumulação diretamente financeira, especulativa, tem no monopólio imperialista o seu ator por excelência, devido à magnitude do capital que transita pelos circuitos internos de cada monopólio. O capital financeiro, no conceito leninista de um mesmo grupo monopolista atuando em ramos industriais e bancários, é o agente principal desses fluxos de capitais financeiros-especulativos. A circulação puramente fictícia desses capitais e o rentismo dos seus proprietários caracterizam o que Lenin chamava de “capitalismo parasitário ou em decomposição”, que também integra a definição leninista de imperialismo.

   A exacerbada ampliação de capital fictício no capitalismo do final do século XX e início do século XXI é uma característica integrante do sistema imperialista atual, com a interrupção de sua acumulação e a repentina destruição desse capital sendo, no mais das vezes, o momento que marca o início da crise do capital e uma característica do agravamento dessa própria crise.

6) Burguesia monopolista e as demais frações do capital: a constituição dos monopólios capitalistas nas principais potências imperialistas marcou a passagem do capitalismo para sua nova etapa, o imperialismo, na virada dos séculos XIX e XX. Nestas primeiras décadas do século XXI, a tendência à monopolização já atingiu efetivamente praticamente todos os países do mundo e todos os principais ramos da produção, tanto em nível nacional quanto mundial. Dessa forma, a existência dos monopólios dominando as economias nacionais não é mais característica apenas dos países imperialistas. Nos países dominados, vemos a existência e a atuação conjunta dos monopólios transnacionais dos países imperialistas e dos monopólios da burguesia do próprio país dominado (além de alguns monopólios estatais).

   Portanto a existência de monopólios nos países dominados não pode ser desconsiderada ao se realizar a análise das classes dominantes e de suas frações nesses países. Por um lado, já vimos a subordinação do capital não monopolista aos monopólios. Dessa forma, segmentar as frações burguesas apenas por ramos de atividade, desconsiderando os capitais monopolistas, nos parece um erro. Por outro, os monopólios frequentemente abarcam diferentes ramos de atividade, de forma que a associação dos seus interesses a um único ramo também nos parece um equívoco. Ainda, os capitais monopolistas podem ter interesses comuns entre si, que não estão presentes nas tradicionais análises de frações de classe. Por fim, isso também pode ser verdade entre os monopólios transnacionais e os monopólios da burguesia local atuando em um mesmo país, por sobre ou ao lado das suas contradições.

   Dessa forma, um possível caminho para uma análise teórica mais robusta das classes dominantes e de suas frações hoje, também nos países dominados, seria analisar concretamente, em cada formação social concreta, a hipótese de as frações monopolistas constituírem o núcleo central das classes dominantes. Essa hipótese permitiria avaliar, em conjunto, o grande capital monopolista atuando no país; sua dominação interna e expansão internacional; sua complementariedade/contradições com os monopólios transnacionais; como subordina/concorre com os capitais não monopolistas; se esse capital monopolista possui um programa próprio e qual seria; como seus interesses se traduzem em discursos e partidos políticos e políticas de estado e quais os programas, discursos, partidos e políticas concorrentes/contrárias; etc.

Combater o Oportunismo como parte integrante do combate ao Imperialismo

   Como vimos, Lenin buscava explicar “a vitória monstruosa e abominável … [do] oportunismo … sobre o movimento operário na Europa” no começo do século XX e sua ligação com o imperialismo. Passadas as duas primeiras décadas do século XXI, nosso papel é constatar o amplo domínio de posições oportunistas e reformistas na classe operária e nas demais classes dominadas, assim como em seus movimentos e suas lutas na absoluta maioria dos países (e não apenas nos europeus). Completa esse quadro a pequena expressão de massas da posição revolucionária do proletariado em caráter mundial e em cada país.

   Lenin buscava, em seu texto de 1916, as razões objetivas, materiais, para tal vitória do oportunismo e as encontrou no fato de que a “burguesia de uma ‘grande’ potência imperialista pode economicamente subornar as camadas superiores dos ‘seus’ operários”, ao mesmo tempo em que “oprimem, subjugam, arruínam, a massa do proletariado e do semiproletariado”. Lenin concluiu que, naquela época, “economicamente já amadureceu e se realizou a passagem da camada da aristocracia operária para a burguesia”. Politicamente, essa consolidação das bases do oportunismo se traduz no fato de que “agora o ‘partido operário burguês’ é inevitável e típico de todos os países imperialistas”. E atualmente não apenas nesses países, como o comprova exemplarmente o caso brasileiro contemporâneo, com o PT, o PCdoB, entre outros.

   Essa é a divisão, a cisão do socialismo de que fala o artigo de Lenin: a “corrente revolucionária de massas contra a corrente oportunista pequeno-burguesa”.

   E em um país dominado como o Brasil, nos anos 2000, quais as razões para o predomínio do oportunismo e do reformismo no movimento operário e de massas? Em parte, podemos partir da mesma explicação. A diferença das condições de salários, participação nos lucros, “direitos” trabalhistas e demais condições de vida de uma parcela pequena da classe operária, a defesa dessas diferenciações, o temor de perdê-las como fatores objetivos para a adoção de posições de conciliação de classes.

 No entanto, isso não é tudo. É preciso considerar ao menos três fatores adicionais para explicar o oportunismo e o reformismo e definir a atuação dos comunistas no combate sem tréguas contra ele:

1) o oportunismo das direções sindicais: a captura dos aparelhos sindicais e de suas direções (que buscam perpetuar-se nessa condição separada dos demais operários) pela burguesia, para que passem a defender posições oportunistas, posições burguesas no meio operário, moderando e institucionalizando a luta de classes do proletariado, é fato mais do que conhecido, inclusive pela prática quotidiana da militância de cada camarada, com inúmeros exemplos.

   A esse respeito, Lenin cita as palavras de Marx, explicitamente denunciando que “os dirigentes-operários ingleses venderam-se”. Em outro trecho: “é de lamentar que todo o bando dos chefes não tenha entrado para o Parlamento. Seria o caminho mais seguro para nos vermos livres dessa canalha”. Aqui no Brasil, o cretinismo parlamentar foi o caminho “natural” de vários deles…

2) as condições subjetivas a partir da ideologia dominante: nas condições atuais de domínio absoluto do capitalismo e de derrota do socialismo, a ideia revolucionária está muito distante das massas. A ideologia dominante, nas suas mais variadas formas, prega a inevitabilidade desse estado de coisas (a exploração capitalista); a ideia de não contar com as próprias forças, mas de canalizar as reivindicações nas instâncias institucionais do Estado capitalista (executivo, parlamento, judiciário); a ideia de luta como limitada a reivindicações sindicais e institucionais; etc.

3) ausência do partido comunista com presença nas massas operárias: fator adicional para a hegemonia do oportunismo e do reformismo é a ausência da posição revolucionária organizada, do partido comunista, com forte participação na luta de classes ao lado dos dominados.

   Por esse conjunto de fatores, temos esse prolongado período de predomínio absoluto do oportunismo e do reformismo e de sua subserviência aos patrões.

 Cabe, portanto, aos comunistas e ao proletariado nos dias de hoje reforçar essa “cisão do socialismo”, demarcar o campo com o oportunismo e o reformismo, diferenciando-nos explicitamente deles, sendo o seu contrário. A pergunta que deve nos guiar nessa ação é a mesma já feita por Lenin: “o principal — … significado real, objetivo, da sua política: esta política representa as massas, serve as massas, isto é, a libertação das massas do capitalismo, ou representa os interesses de uma minoria, a sua conciliação com o capitalismo?”.

  Para isso, é imprescindível não se afastar, não se diferenciar, dos/as operários/as e das massas. Pelo contrário, toda a linha de massas dos comunistas implica a necessidade de trabalhar e lutar lado a lado, ombro a ombro, com a classe operária e com as massas exploradas, independentemente de as mesmas estarem sujeitas a direções e a linhas oportunistas e mesmo quando elas estejam vinculadas a sindicatos e a movimentos reformistas.

Vamos concluir essa nossa análise com as conclamações de Lenin em 1916:

“O fato é que os ‘partidos operários burgueses’, como fenômeno político, se formaram já em todos os países capitalistas avançados, que sem uma luta decidida e implacável em toda a linha contra estes partidos — ou grupos, correntes, etc., tanto faz — nem sequer se pode falar de luta contra o imperialismo ou de marxismo ou de movimento operário socialista”.

“o nosso dever, se queremos permanecer socialistas, é ir mais baixo e mais fundo, para as verdadeiras massas: nisto consiste toda a importância da luta contra o oportunismo e todo o conteúdo desta luta. Desmascarando que os oportunistas … traem e vendem de fato os interesses da massa, … que eles propagam as ideias e a influência burguesa, que eles são de fato aliados e agentes da burguesia — ensinamos deste modo as massas a identificar os seus reais interesses políticos, a lutar pelo socialismo e pela revolução …”.

 “Explicar às massas a inevitabilidade e a necessidade da cisão com o oportunismo, educá-las para uma luta revolucionária implacável contra ele … — tal é a única linha marxista no movimento operário do mundo”.

Fonte: https://cemflores.org/

Edição: Página 1917


 


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