Antonio Gramsci
1925
[...] A luta econômica não pode ser separada da luta política, e nem uma nem outra pode ser separada da luta ideológica.
Na primeira fase, sindical, a luta econômica é espontânea. Isto é, nasce inelutavelmente da própria situação em que se encontra o proletariado sob o regime burguês, mas ela não é, em si própria, revolucionária. Quer dizer, não leva necessariamente à destruição do capitalismo, como os sindicalistas há muito argumentam (com algum sucesso).
Em qualquer caso, os reformistas e mesmo os fascistas permitem alguma luta sindical elementar. Ou melhor, eles sustentam que o proletariado como classe não pode se envolver em nenhuma luta senão a sindical.
A luta sindical pode se tornar um fator revolucionário se o proletariado combiná-la com a luta política. Explicando de outro modo, se o proletariado se torna consciente de ser o protagonista em uma batalha muito mais ampla - aquela que assume todas as questões mais vitais sobre a organização da sociedade (ou seja, toma consciência de que está lutando pelo socialismo).
O elemento de espontaneidade nunca é suficiente para uma luta revolucionária. Nunca levará a classe trabalhadora além dos limites da democracia burguesa existente. Para que isso ocorra, um elemento ideológico consciente é necessário. Isso implica uma compreensão das condições em que a classe luta, das relações sociais em que vivem os trabalhadores, das tendências fundamentais que operam nessas relações sociais e do desenvolvimento da sociedade (impulsionada pelos antagonismos irreconciliáveis em seu seio) etc.
Essas três frentes da batalha proletária reduzem-se a uma só para o partido da classe operária. Ela cumpre esse papel precisamente porque retoma e representa todas as demandas da luta geral.
Claro, não podemos pedir a cada trabalhador que tenha uma compreensão completa de todas as funções complexas que sua classe realizará no processo de desenvolvimento da humanidade. No entanto, devemos pedir isso aos membros do partido.
Não se pode propor, antes da conquista do poder do Estado, a modificação completa da consciência de toda a classe trabalhadora. Isso seria utópico, porque a consciência de classe como tal só muda quando as condições de vida dessa classe também mudam. Em outras palavras, quando se torna a classe dominante e tem à sua disposição os meios de produção, de troca, e detém o poder do Estado.
Mas o partido pode, e deve, em sua totalidade, representar essa consciência avançada. Caso contrário, o partido não estará na cabeça, mas na cauda das massas. Não será capaz de liderá-las - em vez disso, será arrastado atrás delas. É por isso que o partido deve assimilar o marxismo, e deve assimilá-lo em sua forma atual - o leninismo.
[...] Para lutar contra a confusão que assim se criou, o partido precisa intensificar e sistematizar sua atuação no campo ideológico. O partido deve deixar claro que seus militantes têm o dever de compreender a doutrina marxista-leninista, pelo menos em seus termos mais gerais.
Nosso partido não é um partido democrático - pelo menos não no sentido vulgar que é comumente dado a essa palavra. O partido é centralizado de forma racional e internacional. Na arena internacional, nosso partido é uma seção simples de um partido muito maior, um partido do mundo inteiro.
Pode ser uma necessidade absoluta de revolução, mas que repercussões esse tipo de organização pode ter? A própria Itália nos dá uma resposta a esta pergunta. Em reação às tendências usuais dentro do Partido Socialista (em que muito se discute, mas pouco se resolve, e cuja unidade é frequentemente destruída pelos confrontos contínuos de diferentes facções, tendências e camarilhas), nosso partido acabou por não discutir nada.
A centralização do nosso partido e sua direção e concepções unificadas deram origem a uma estagnação intelectual. A necessidade constante de lutar contra o fascismo contribuiu para essa tendência. De fato, mesmo antes de o partido ser fundado, o fascismo havia passado para sua primeira fase ativa e ofensiva.
No entanto, uma concepção errônea do partido - apresentada na Tese sobre táticas do congresso de Roma - também contribuiu para o mal-estar. Centralização e unidade foram concebidas de uma maneira muito mecânica: o comitê central (ou melhor, o comitê executivo) foi considerado o partido, ao invés de seu representante e guia. Se essa concepção fosse aplicada de forma permanente, o partido perderia suas características políticas distintivas. Seria, na melhor das hipóteses, um exército (e burguês). Ele perderia seus poderes de atração e se distanciaria das massas.
Para que o partido viva e esteja em contato com as massas, cada membro precisa ser um elemento político ativo - ou seja, um líder. Especificamente porque o partido está fortemente centralizado, é necessária uma grande quantidade de propaganda e agitação entre suas fileiras. É preciso que o partido eduque seus militantes e eleve seu patamar ideológico de forma organizada.
Centralização desse tipo significa que, em
qualquer situação (mesmo que em estado de sítio, mesmo que os comitês
dirigentes não possam funcionar por um determinado período ou não possam se
articular com a periferia), todos os membros do partido podem se orientar em
seus próprios círculos. Significa que cada um deles deve poder tirar da
situação os elementos necessários para definir uma linha política - de modo a
fazer com que a classe trabalhadora não desanime, mas sinta que tem um rumo, e
ainda é capaz de lutar. A preparação ideológica das massas é, portanto, uma
necessidade absoluta para a luta revolucionária. É uma das condições indispensáveis
para a sua vitória.
Fonte: Escritos Políticos, Vol. 4, Para uma Preparação Ideológica das Massas, 1925.
Edição: Página 1917
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