Leandro Gamarra
Ao presidente Alberto Fernández já não pedimos que exproprie
Vicentín¹ ou institua o imposto sobre a fortuna por decreto.
Repressão para expulsar famílias sem teto em Guernica. |
O que pedimos a você neste momento do jogo é que pelo menos controle o preço de um quilo de limões, ou de uma dúzia de ovos, cada vez mais fora do alcance do bolso do trabalhador.
Não é uma piada. Porque se analisarmos em profundidade neste contexto de pandemia global causada por um vírus, é um verdadeiro absurdo que um assalariado não possa garantir algo tão básico quanto a possibilidade de incorporar uma boa dose de vitamina C e de proteínas em seu metabolismo e no de seus filhos através dos alimentos que ele produz. Principalmente em um país onde o solo produziu, só em 2019, 134 milhões de toneladas de cereais e oleaginosas a um valor de mercado, incluindo subprodutos de 33.962 milhões de dólares. As dores são nossas, as commodities dos outros ...
Mas caramba, o que vamos pedir a um governo que, sem a menor
vocação para deter as mãos do grande capital, deixou o destino de milhões de
trabalhadores, em sua maioria precários e sem cobertura de saúde, forçados aos
caprichos do deus do mercado, enfrentarem diariamente a possibilidade de
contágio em troca de um salário que não dá para nada, ou de um miserável bico.
Porque não é mais o vírus. Digamos de uma vez por todas,
Alberto Fernández não consegue mais parar nem um táxi.
Não somos astrólogos nem iluminados, bastava raciocinar com
instinto e consciência de classe para anteciparmos há pouco mais de um ano,
quando avisamos aos nossos e aos demais que este seria um governo de ajuste e
repressão. Não é preciso ser um gênio para saber como pode se desenvolver o
bloco bonapartista do esquema republicano burguês, neste caso representado pela
ménage troi Alberto-Cristina-Massa, quando quem o precede na administração do
Estado não deixa nem um tostão para fazer política, ou para criar a ilusão
populista de uma suposta redistribuição de riqueza. Não senhores. Quando não há
mais soja a 600 dólares a tonelada, ou quando o capitalismo global ainda tenta
se recuperar da crise de 2008 (mais a crise que está por vir), o populismo,
como sempre aconteceu na história, tira a máscara, mostra os dentes de classe e
sua pouca propensão a reduzir a renda dos mais ricos.
Nesse panorama de devastação, no dia 29 de outubro, ocorreram
dois fatos, um notório, o outro nem tanto, que definem de forma categórica a
política antipopular dessa continuidade Macrista denominada “Frente de todos”.
Por trás dos fatos sinistros da triste manhã de Guernica,
onde as forças repressivas a mando da patética dupla Kicillof-Berni espancaram
e, inclusive balearam mulheres, crianças e homens desarmados (fato que foi
festejado pelo próprio Eduardo Feinmann no seu programa de rádio), foi
divulgada na área financeira a notícia de que os títulos da dívida argentina já
estão sendo negociados como antes da última troca. Traduzido para quem
acertadamente sente que os movimentos das finanças são um hieróglifo: após o
anúncio com grande alarde da última troca com redução de juros, em pouco menos
de 4 meses a Argentina se vê novamente diante da possibilidade de um calote,
isto é, às portas de uma nova troca de títulos de dívida. Sem contar as duras
medidas que estão negociando nas sombras com a “muito sensível diretora do FMI, porque viveu quando criança a pobreza
de um país comunista” – segundo as palavras do atual presidente.
Até o economista burguês Julián Yosovitch explica: “Quando o título é avaliado em sua paridade,
o que começamos a fazer é determinar quanto valerá o novo título a ser entregue
em troca como resultado do processo de reestruturação, ou o que este bônus
permitirá que você recupere após a reestruturação. Ou seja, se trada de um
valor de recuperação no qual o mercado especula quanto valerá cada um desses
títulos quando não sirvam para outra coisa, mas para serem trocados pelos novos
títulos que serão entregues em reestruturação da dívida ".
É que além das proclamações e slogans nac & pop, quem
sabe melhor do que ninguém que a dívida argentina é impagável são os mesmos
usurários. E para isso contam com governos como este, ou o de Macri, que
arbitram o tempo todo a favor dos seus interesses, seja emitindo e endividando internamente
o Estados, seja pedindo socorro aos organismos financeiros internacionais quando
já não houver mais um único peso para financiar a administração do Estado
burguês. Sempre desenhando esquemas de reestruturação permanente que nada mais
fazem do que aperfeiçoar o sistema de Dívida Perpétua instalado por sangue,
fogo, tortura e desaparecimentos pela ditadura há quase 45 anos. Essa é a
verdade. Todo o resto é papelão pintado. Ou colocado de uma forma mais
marxista, essa é a realidade efetiva que se oculta por trás das aparências e as
supostas “boas intenções” do bonapartismo.
Continuar sustentando o contrário, tratando de disfarçar o
que aos olhos de todo o planeta é uma nova demonstração das limitações do
sistema político do capitalismo para resolver os problemas fundamentais dos
trabalhadores, é seguir ajoelhando a militância diante do fato irreversível de
um fracasso histórico sem precedentes. Fique claro, os dirigentes que
conduziram o PC a formar parte de um governo que ajusta, reprime e assassina,
são e serão os únicos responsáveis.
Notas do editor:
¹ Conglomerado agropecuário argentino que possui cerca de 25 empresas, principal cerealífera do país, está em processo de quebra e sob investigação judicial por fraude em empréstimos e fuga de capitais.
Edição e tradução: Página 1917.
Fonte: https://revistacentenario.com/acompanando-a-las-masas-peronistas-al-abismo/
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