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terça-feira, 8 de outubro de 2019

Os Dez Dias que Abalaram o Mundo


John Reed (1887-1920)
   Os mencheviques e os social-revolucionários acreditavam que a Rússia não estava amadurecida economicamente para a revolução social, que só era possível uma revolução política. Segundo eles, as massas russas não estavam educadas suficientemente para tomar o poder nas suas mãos; qualquer tentativa nesta via não faria senão provocar uma reação, através da qual um oportunista sem escrúpulos poderia restaurar o antigo regime. Por conseguinte, quando os socialistas "moderados" foram forçados a assumir o poder, não ousariam fazê-lo.

   Acreditavam que a Rússia deveria passar as mesmas fases de desenvolvimento que a Europa ocidental, atingindo finalmente e ao mesmo tempo com o resto do mundo, o paraíso socialista. Assim, naturalmente concordavam com as classes possuidoras que a Rússia devia tornar-se primeiro um Estado parlamentar, ainda que, um pouco mais aperfeiçoado em relação às democracias ocidentais. Em consequência, insistiam na participação das classes possuidoras no Governo. Daí a sustentá-las ia apenas um passo. Os socialistas "moderados" precisavam da burguesia, mas a burguesia não precisava dos socialistas "moderados". Assim, os ministros socialistas foram obrigados a ceder, pouco a pouco, todo o seu programa, enquanto as classes possuidoras tornavam-se cada vez mais exigentes.


   E por fim, quando os bolcheviques colocaram abaixo todo esse edifício de compromissos, os mencheviques e os social-revolucionários encontraram-se  lutando ao lado das classes possuidoras. Em todos os países do mundo, mais ou menos, é visível hoje este mesmo fenômeno.

   Longe de serem uma força destrutiva, parece-me que os bolcheviques eram na Rússia o único partido com um programa construtivo e capaz de impor esse programa ao país. Se não tivessem vencido no momento certo, tenho para mim que os exércitos da Alemanha imperial teriam chegado a Petrogrado e a Moscou em Dezembro e hoje um novo tsar cavalgaria novamente a Rússia.

   Ainda está na moda, após um ano de existência do regime soviético, falar da revolução bolchevique como de uma "aventura". Está bem, se é preciso falar de aventura, foi uma das mais belas em que já  se empenhou a humanidade, aquela que abriu às massas trabalhadoras o terreno da história e, fazendo que hoje tudo dependa de suas vastas e naturais aspirações! Mas há que acrescentar que, antes de Novembro, já estava montado o aparelho pelo qual podiam ser distribuídas pelos lavradores as terras dos grandes latifundiários; que estavam prontos também os Comités de fábrica e os sindicatos para fazer funcionar o controle obreiro da indústria, e que cada cidade, cada aldeia, cada distrito, cada província tinha os seus Sovietes de Deputados obreiros, soldados e camponeses, preparados para assumir a administração local.

   Qualquer que seja a nossa opinião sobre o bolchevismo, é inegável que a Revolução Russa é um dos maiores acontecimentos da história da humanidade, e a ascensão dos bolcheviques ao poder, um fato de importância mundial. Da mesma forma que os historiadores se interessam por reconstruir, nos seus mais pequenos pormenores, a história da Comuna de Paris, igualmente desejarão conhecer o que aconteceu em Petrogrado em Novembro de 1917, o estado de espírito do povo, a aparência de seus chefes, as suas palavras, os seus atos. Pensando neles é que eu escrevi este livro.

   Na luta, as minhas simpatias não eram neutras. Mas ao descrever a história destes grandes dias, tentei estudar os acontecimentos como um cronista consciencioso, interessado em refletir a verdade.*


John Reed
Nova Iorque, 1 de Janeiro de 1919.
*Prefácio do autor.


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