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quinta-feira, 27 de outubro de 2022

O Dilema das Jaulas

Ney Nunes

"Antes de aceitarmos a imposição para entrar na jaula do leão ou na do tigre, devemos considerar que apesar desses felinos serem bem diferentes, suas garras e mandíbulas são igualmente poderosas."

 



     Quando a contradição e a desorientação predominam, é natural que os argumentos se tornem rasos. Neste segundo turno eleitoral é justamente isso o que presenciamos e de forma ainda mais intensa do que no primeiro. De forma geral, aqueles que se reivindicam à esquerda do petismo dizem que o prioritário é derrotar o fascista nas urnas para impedir um segundo mandato que aprofundaria o “retrocesso civilizatório”. Diante do horror despertado pelo avanço da extrema direita, apontam que existem apenas dois caminhos possíveis: seguir a reboque da frente ampla social-liberal ou sucumbir ao bolsonarismo.

     Em reforço dessa tese, afirmam que os defensores da abstenção ou do voto nulo colocam um sinal de igual entre Lula e Bolsonaro ao não reconhecer que em muitos aspectos os dois candidatos são diferentes: Lula defende a democracia, Bolsonaro a ditadura; Lula respeita a independência dos poderes, Bolsonaro quer manietar o STF e etc. Mas esquecem, de forma conveniente, de verificar as semelhanças. Elas existem e a principal delas é estratégica, os dois candidatos têm como horizonte político atender aos interesses gerais da classe dominante, servindo como administradores do Estado burguês no âmbito da inserção subalterna do Brasil no sistema imperialista, tendo, inclusive, já fornecido suficientes provas disso durante seus mandatos presidenciais.

     Ao falarem de um “retrocesso civilizatório”, estão, na verdade, defendendo a continuidade dessa sociedade burguesa em tempos de barbárie. Ignoram ou, fingem ignorar, que o bolsonarismo (assim como o nazifascismo na Europa dos anos 1930) é subproduto da barbárie capitalista, nasceu dos escombros de nossas derrotas, do retrocesso da consciência de classe, da desorganização e fragmentação do proletariado nos últimos trinta anos de hegemonia socialdemocrata no movimento de massas aqui no Brasil.

     Está mais do que evidente que a burguesia se apresenta dividida nesse segundo turno eleitoral e essa divisão expressa sua crise diante de um capitalismo agonizante que exige doses cavalares de superexploração. A diferença entre os dois blocos burgueses é quanto a melhor forma de manter a dominação político-ideológica sobre as massas, sobre o grau de coerção e consenso necessários para atingir esse objetivo. Mas o horizonte estratégico é o mesmo, ou seja, manter o país atrelado de forma subalterna ao sistema imperialista mundial, preservando assim os seus lucros bilionários e confinando a imensa maioria dos brasileiros na situação de miséria.

     O desfecho dessa verdadeira guerra de classes não virá do resultado dessas eleições burguesas, as batalhas decisivas ainda estão por vir e inevitavelmente serão cada vez mais violentas face ao avanço da barbárie capitalista. O caminho gradual e pacífico desde sempre foi interditado pela burguesia e o imperialismo, ele segue vigente apenas nos devaneios reformistas daqueles que perderam o referencial da luta de classes. Reconstruir o bloco proletário pelo socialismo, independente da burguesia e preparado para o enfrentamento em todos os terrenos, é a única alternativa para não sermos massacrados nesses futuros combates.

     Antes de aceitarmos a imposição para entrar na jaula do leão ou na do tigre, devemos considerar que apesar desses felinos serem bem diferentes, suas garras e mandíbulas são igualmente poderosas.

 27/10/2022  

Edição: Página 1917     

 

    

    

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