Muitos nem sabem que sou torcedor do Tricolor
das Laranjeiras, pouco falo e quase nunca escrevo sobre futebol, exceção feita para
algumas gozações inevitáveis nas conversas entre amigos. Fiquei mais de vinte
anos sem pisar no Maracanã, retornei lá esse ano para assistir a uma partida do
brasileirão, por sinal, uma exibição medíocre do meu time. O antigo “Templo do
Futebol”, outrora maior estádio do mundo, estava muito mudado. Não reencontrei
aquela enorme arena com capacidade de abrigar duzentas mil almas, em que pese o
desconforto para os frequentadores da geral e das arquibancadas. Estava agora
diante de um pequeno estádio, mais confortável e com boa visibilidade do campo,
se bem que acanhado perto do antigo gigante.
Mas os motivos desse meu afastamento do
estádio que desde muito pequeno, levado pelas mãos do meu saudoso pai, me
acostumei a frequentar e onde fui contaminado por essa paixão pelo futebol, não
estão ligados às obras de reforma do Maracanã, diga-se de passagem, todas elas
superfaturadas pelos governantes bandidos. Na verdade, foram duas outras razões
que me levaram a esse distanciamento, não só do velho estádio, mas também do
próprio futebol.
A primeira tem a ver com a percepção de
que o futebol sofreu uma brutal transformação entre os anos sessenta e noventa
do século passado, acabando totalmente engolido pelo sistema, virando muito
mais um “negócio” do que um “esporte”. Acabara-se o tempo onde os jogadores
eram formados e permaneciam nos seus clubes, onde verdadeiras escolas ou
academias de futebol aprimoravam seus estilos, onde uma verdadeira identidade
entre torcedores e seus ídolos era construída ao longo de anos. Prevalece agora
o transitório, os valores exorbitantes, os interesses escusos, os jogadores por
temporada, os times e estilos de se jogar futebol pasteurizados.
A segunda motivação veio com essa
execrável penetração da violência urbana no mundo do futebol. Grupos, na
maioria das vezes estimulados e financiados por dirigentes desses clubes
empresas, foram se adensando e levando para os estádios e seus entorno a
prática do confronto e da agressão, transformando simples adversários em
inimigos mortais. As frustrações sociais fomentadas pela crise crônica em que
vivemos encontraram aí um perfeito canal de expressão.
A gota d’água foi quando, lá pelo início dos anos noventa, saíamos do
Maracanã, eu e meu compadre, acompanhados dos nossos respectivos filhos, então
contando dez ou onze anos de idade, ao final de um jogo entre Fluminense e Vasco.
Nós voltávamos para casa quando fomos surpreendidos por um bando de jovens covardes
que tentou nos agredir, simplesmente porque nossos filhos vestiam camisas do
fluminense. Por pouco não aconteceu uma tragédia, como tantas outras sucedidas
ao início, durante e no final dos jogos. Nesse dia resolvi colocar um ponto
final na minha relação com o “maraca”. Percebi que não podia fazer como o meu
pai, não era mais seguro levar meu filho ao estádio para ver o futebol.
Passado esse tempo, vejo que a violência
se expandiu, contaminando até mesmo as relações de amizade, quando gozações
passam rapidamente para as ofensas e xingamentos, provocando divisões
artificiais entre aqueles que deveriam estar cada vez mais unidos para
enfrentar a verdadeira hecatombe social em que estamos mergulhados por conta da
degeneração acelerada desse capitalismo, o sistema econômico que transformou o
nosso querido futebol em um mero negócio.
Ney Nunes
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