Lenin (20-08-18)
[...] O proletariado assimila agora, entre os
horrores da guerra imperialista, de forma completa e evidente, a grande verdade
que ensinam todas as revoluções, a verdade legada aos operários pelos seus
melhores mestres, os fundadores do socialismo moderno. Esta verdade consiste em
que não pode haver uma revolução com êxito sem esmagar a resistência dos
exploradores. O nosso dever, quando nós, os operários e camponeses
trabalhadores, tomámos o poder de Estado, era esmagar a resistência dos
exploradores. Orgulhamo-nos porque o fizemos e continuamos a fazê-lo.
Lamentamos não termos feito com suficiente firmeza e decisão.
Nós sabemos que em todos os países é
inevitável uma resistência raivosa da burguesia contra a revolução socialista e
que ela crescerá à medida que cresce esta revolução. O proletariado quebrará
esta resistência, ele amadurecerá definitivamente para a vitória e para o poder
no decurso da luta contra a burguesia que opõe resistência.
Que a imprensa burguesa corrupta grite aos
quatro ventos acerca de cada erro cometido pela nossa revolução. Não temos medo
dos nossos erros. Pelo fato de a revolução ter começado, os homens não se
tornam santos. As classes que durante séculos foram oprimidas, embrutecidas e
mantidas pela violência nas garras da miséria, da ignorância e do
asselvajamento não podem fazer a revolução sem erros. E é impossível, como já
tive uma vez ocasião de assinalar, fechar o cadáver da sociedade burguesa num
caixão e enterrá-lo. O capitalismo morto apodrece e decompõe-se entre nós, contaminando
o ar com miasmas, envenenando a nossa vida, envolvendo aquilo que é novo,
recente, jovem e vivo com milhares de fios e laços daquilo que é velho, podre e
morto.
Por cada cem erros nossos, sobre os quais
gritam aos quatro ventos a burguesia e os seus lacaios (incluindo os nossos
mencheviques e socialistas-revolucionários de direita) há dez mil atos
grandiosos e heroicos — tanto mais grandiosos e heroicos quanto são simples,
invisíveis, ocultos na vida quotidiana dum bairro fabril ou duma aldeia perdida,
são realizados por pessoas que não estão acostumadas (e não têm a
possibilidade) a gritar aos quatro ventos sobre cada êxito seu.
Mas ainda que fosse o contrário — embora eu
saiba que tal suposição não é verdadeira — ainda que por 100 atos justos nossos
houvesse 10 000 erros, mesmo assim a nossa revolução seria, e será perante a
história mundial, grande e invencível, pois pela primeira vez não é a minoria,
não são apenas os ricos, não são apenas as pessoas instruídas, mas uma
verdadeira massa, uma enorme maioria dos trabalhadores, que constroem eles
próprios a nova vida, resolvem as questões mais difíceis da organização
socialista com a sua experiência.
Cada erro neste trabalho, neste trabalho
sincero e consciencioso de dezenas de milhões de simples operários e camponeses
para reestruturar toda a sua vida, cada erro desse vale milhares e milhões dos
êxitos «sem erros» da minoria exploradora, dos êxitos em lograr e iludir os
trabalhadores. Pois só através de tais erros os operários e camponeses aprenderão
a construir a nova vida, aprenderão a passar sem os capitalistas, só assim eles
abrirão o caminho — através de milhares de obstáculos — para o socialismo
vitorioso.
Cometem erros ao fazer o seu trabalho
revolucionário, os nossos camponeses, que de um só golpe, numa só noite, de 25
a 26 de Outubro (velho estilo) de 1917, aboliram toda a propriedade privada da
terra e estão agora, de mês para mês, superando dificuldades imensas,
corrigindo-se a si próprios, a cumprir na prática a tarefa dificílima de
organizar novas condições de vida económica, de lutar contra os kulaques, de
garantir a terra para os trabalhadores (e não para os ricos), de passar à
grande agricultura comunista.
Cometem erros ao fazer o seu trabalho
revolucionário os nossos operários, que nacionalizaram agora, em alguns meses,
quase todas as grandes fábricas, e estudam, através de um duro trabalho
quotidiano, a nova obra de gestão de ramos inteiros da indústria, que organizam
as empresas nacionalizadas, superando a gigantesca resistência da rotina, do
espírito pequeno-burguês, do egoísmo, que lançam, pedra a pedra, os alicerces
de novas relações sociais, de uma nova disciplina do trabalho, de um novo poder
dos sindicatos operários sobre os seus membros.
Cometem erros ao fazer o seu trabalho
revolucionário os nossos Sovietes, criados já em 1905 pelo poderoso ascenso das
massas. Os Sovietes de operários e camponeses são um novo tipo de Estado, um
novo tipo, superior, de democracia, são a forma da ditadura do proletariado, o
meio de administrar o Estado sem a burguesia e contra a burguesia. Pela
primeira vez a democracia serve aqui para as massas, para os trabalhadores,
deixando de ser uma democracia para os ricos, como continua a ser a democracia
em todas as repúblicas burguesas, mesmo nas mais democráticas. Pela primeira
vez as massas populares cumprem a tarefa, à escala de centenas de milhões de
pessoas, da realização da ditadura dos proletários e semiproletários — tarefa
sem cujo cumprimento não se pode sequer falar de socialismo.
Que os pedantes ou os homens incuravelmente
cheios de preconceitos democrático-burgueses ou parlamentares abanem
perplexamente a cabeça a propósito dos nossos Sovietes de Deputados,
detendo-se, por exemplo, na ausência de eleições diretas. Essas pessoas não esqueceram
nem aprenderam nada no período das grandes viragens de 1914-1918. A união da
ditadura do proletariado com a nova democracia para os trabalhadores, da guerra
civil com a mais ampla participação das massas na política — tal união não pode
ser conseguida imediatamente e não cabe nas formas triviais do democratismo
parlamentar rotineiro. Um novo mundo, o mundo do socialismo — eis o que se nos
apresenta nos seus contornos sob a forma de República Soviética. E não admira
que este mundo não nasça já pronto, não saia de uma vez, como Minerva da cabeça
de Júpiter.
Enquanto as velhas constituições
democrático-burguesas exaltavam, por exemplo, a igualdade formal e o direito de
reunião, a nossa Constituição Soviética proletária e camponesa rejeita a hipocrisia
da igualdade formal. Quando os republicanos burgueses derrubavam tronos, então
não se preocupavam com a igualdade formal dos monárquicos com os republicanos.
Quando se trata de derrubamento da burguesia, só traidores ou idiotas podem
reclamar uma igualdade formal de direitos para a burguesia. Não vale um tostão
a «liberdade de reunião» para os operários e camponeses se todos os melhores
edifícios estão em poder da burguesia. Os nossos Sovietes tiraram aos ricos
todos os bons edifícios, tanto nas cidades como nas aldeias, entregando todos
estes edifícios aos operários e camponeses para as suas uniões e assembleias.
Eis a nossa liberdade de reunião --- para os trabalhadores! Eis o sentido e o
conteúdo da nossa Constituição Soviética, da nossa Constituição Socialista!
E eis porque todos nós estamos tão
profundamente convencidos de que, quaisquer que sejam as desgraças que caiam
sobre a nossa República dos Sovietes, ela é invencível.
Ela é invencível porque cada golpe do
imperialismo enraivecido, cada derrota que a burguesia internacional nos
inflige, levantam para a luta novas e novas camadas de operários e camponeses,
ensinam-nos ao preço dos maiores sacrifícios, temperam-nos, geram um novo
heroísmo de massas.
Nós sabemos que a vossa ajuda, camaradas
operários americanos, não chegará, talvez, muito rapidamente, pois o
desenvolvimento da revolução nos diversos países se realiza sob formas
diferentes e a ritmos diferentes (e não pode realizar-se de outra maneira). Nós
sabemos que a revolução proletária europeia pode não eclodir ainda nas próximas
semanas, por mais rapidamente que tenha amadurecido nos últimos tempos. Nós
apostamos na inevitabilidade da revolução internacional, mas isso não significa
de modo algum que apostemos como tontos na inevitabilidade da revolução num
período determinado e curto. Nós vimos as duas grandes revoluções de 1905 e de
1917 no nosso país e sabemos que as revoluções não se fazem por encomenda nem
por acordo. Nós sabemos que as circunstâncias lançaram para a frente o nosso destacamento,
o destacamento da Rússia do proletariado socialista, não devido aos nossos
méritos, mas devido a um atraso especial da Rússia, e que antes que rebente a
revolução internacional é possível uma série de derrotas de diferentes
revoluções.
Apesar disso, sabemos firmemente que somos
invencíveis, porque a humanidade não será quebrada pelo massacre imperialista,
mas superá-lo-á. E o primeiro país que quebrou as grilhetas da guerra
imperialista foi o nosso país. Suportámos duríssimos sacrifícios na luta pela
destruição dessas grilhetas, mas quebrámo-las. Estamos fora de dependências
imperialistas, levantámos perante todo o mundo a bandeira da luta pelo
derrubamento completo do imperialismo.
Encontramo-nos como que numa fortaleza
assediada, enquanto não chegarem em nossa ajuda outros destacamentos da
revolução socialista internacional. Mas esses destacamentos existem, são mais
numerosos do que os nossos, eles amadurecem, crescem, reforçam-se à medida que
prosseguem as atrocidades do imperialismo. Os operários rompem com os seus
sociais-traidores, os Gompers, Henderson, Renaudel, Scheidemann, Renner. Os
operários avançam devagar, mas firmemente, para a táctica comunista,
bolchevique, para a revolução proletária, a única que está em condições de
salvar a cultura e a humanidade que se afundam.
Numa palavra, somos invencíveis, pois é
invencível a revolução proletária mundial.
*Trecho da Carta ao Operários Americanos.
Edição: Página 1917.
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